6:53Um revólver com seis balas no tambor

por Ruy Castro, na FSP

É como psicólogos e pediatras veem o celular na mão das crianças e se perguntam se ainda há como reverter

Foi outro dia, eu vi. Um bebê de menos de um ano, sentado no chão, pegou um controle remoto de televisão sobrando por ali. Sem piscar, começou a apertar os botões e a acompanhar as mudanças de imagens na tela, como se já soubesse o seu uso. Depois, num aeroporto, flagrei um garoto brincando de joguinhos num smartphone —tudo bem, só que a bordo de um carrinho empurrado pela mãe. E já ouvi falar de outro que, quando lhe deram um ursinho de pelúcia, ficou procurando as teclas. Talvez tais capacidades já estejam embutidas nas crianças ao nascer. Talvez as aprendam no próprio útero, já que suas mães, lá fora, não passam um minuto sem o aparelho. Será isso?

Antes que me acusem de primata antitecnológico, informo que essa preocupação não é minha. É do psicólogo americano Jonathan Haidt, autor do livro “A Geração Ansiosa“, recém-lançado pela Companhia das Letras, secundado pelo pediatra brasileiro Daniel Becker, autor do texto da contracapa. Para Becker, “a hiperconexão está causando uma epidemia de transtornos nas crianças e nos adolescentes.” E explicou.

O uso indiscriminado do celular por menores de 14 anos pode levar à dependência da internet e lhes causar alterações no cérebro, como problemas de saúde mental, física e socioemocional. Exemplos: atraso no desenvolvimento cognitivo, perda de aprendizado, déficit de atenção, mudanças de comportamento, extrema agressividade e isolamento social. Os de desenvolvimento físico incluem miopia, sedentarismo, fraqueza muscular, fraca coordenação motora e perturbação do ciclo do sono. Mais comum do que se pensa é o descontrole dos esfíncteres —a criança fazendo suas necessidades fisiológicas sentada onde estiver, para não ter de levantar-se e interromper a conexão, mesmo levando o aparelho.

E há o acesso à pornografia e às fake news, o uso da inteligência artificial para produzir cyberbullying e alterar vídeos para prejudicar colegas e a indução a dietas fatais, a proezas físicas impossíveis e a brincar de suicídio.

Como reverter isso? Na mão de uma criança, um revólver com seis balas no tambor não é tão perigoso.

6:40A cadeirada histórica

José Luiz Datena (PSDB) entrou para a história dos debates entre candidatos ao acertar uma cadeirada em Pablo Marçal (PRTB) ontem à noite, ao vivo, na TV Cultura de São Paulo. Esqueceu a livre expressão e praticou a livre agressão. Disse depois que seria melhor ter abandonado o programa e ido pra casa. Na verdade, com seu histórico de desistências em campanhas anteriores, não deveria nem ter entrado nessa.

18:25JAMIL SNEGE

Tenho procurado por
todos os meios me destacar
dos demais.
É minha a intervenção mais
inteligente, o lance
intelectual mais audaz.
Procuro as luzes do palco
com o mesmo fervor
com que o peregrino procura
a tua face.
Que tolice, Senhor.
Dentro de alguns anos, numa
tumba escura, que
artifícios usarei para
chamar a atenção sobre o meu
pobre crânio descarnado?

11:09O Vampiro de São Luís

Na sexta-feira 13 um Vampiro saiu da toca. Lá longe, em São Luís do Maranhão. Voou até a livraria Amei para lançar livro – dedicado ao maior de todos, Dalton Trevisan, o de Curitiba. Luis Augusto Cassas mostrou a cara e os caninos para ler poemas do livro “O Vampiro da Praia Grande”. Como chegou até aqui? Mistério. Fica melhor assim. Aguça. Cassas caça carótidas internas e externas desde 1981, quando estreou. Depois lançou mais de três dezenas de livros. Descobri-lo é entregar o pescoço com prazer – e pedir mais. Segue uma pequena mordida que vicia. Depois é outra história:

GENEALOGIA DO CRÁPULA

FILHO DO EGO
NETO DE MORCEGO
BISNETO DE AMOR CEGO

——————————————

VAMPIRO: REDEFINIÇÃO

vampiro
não é quem bebe sangue
vampiro
não é quem vive no mangue
vampiro
não é milk-shake de gangue
vampiro
não é quem ama o sangue
vampiro
é o mais puro-sangue

8:10Velório ao vivo

por Carlos Castelo

§ Fui a um sepultamento recentemente. Fazia um bom tempo que não ia a um, o que, por um lado, é positivo. No entanto, uma coisa me chamou a atenção: um rapaz estava transmitindo as exéquias em tempo real, pelo celular, para parentes que não puderam comparecer à cerimônia. Ele ia fazendo o travelling e narrando: “olha aqui o tio Neno, a tristeza que está esse homem com a morte do primo” E por aí afora. O fato me fez refletir. A tecnologia, que já transformou tantos aspectos de nossas vidas, agora parece estar prestes a digitalizar até o último adeus. Não vai demorar para que velórios online se tornem comuns (se é que já não existem). Escolheremos filtros para o caixão, arranjos de flores 3D, emojis de luto. Só não vai dar para dizer que as transmissões dos enterros são ao vivo.

§ Quando criança, eu era uma espécie de Google da NASA. Sabia tudo sobre a corrida espacial, a Apollo 11, Armstrong, Aldrin, Collins e até sobre engenharia aeronáutica. Tinha absoluta certeza de que, quando adulto, seria astronauta. Hoje, muitos lustros depois, assisto ao documentário Apollo 13: Survival. Nem todos sabem, mas a nave sofreu uma grave pane a centenas de milhares de quilômetros da Terra, obrigando a tripulação a dar meia-volta na Lua e retornar, espremida no módulo lunar. Por muito pouco, o oxigênio e a água não se esgotaram. Para os negacionistas, essa viagem nunca aconteceu. Para mim, no entanto, foi a maior operação de resgate já realizada pelo homem. Claro que me emocionei ao reviver o drama. No entanto, fiquei aliviado de não ter seguido a carreira de astronauta — ainda mais depois de ver Marcos Pontes como ministro da Ciência, Tecnologia e Inovações.

*Publicado em O Dia

8:06Um fim de semana nas ruas

Pareceu coisa combinada, mas não. Desde a noite de sexta-feira os mais fortes candidatos à prefeitura de Curitiba foram às ruas de Curitiba para mostrar que existem de fato. Luciano Ducci fez até comício, ao lado de Goura, naturalmente, na Vila Verde da Cidade Industrial de Curitiba. Ontem Ney Leprevost percorreu o calçadão da Rua XV com apoiadores, mas sem o principal cabo eleitoral, Sergio Moro, que estava no interior cuidando da candidatura dele ao governo do Paraná. No sábado foi a vez da manifestação do candidato Eduardo Pimentel, que lidera as pesquisas. A assessoria informou que ele fez a “carreata da vitória” no Tatuquara e na CIC. O motivo de tanta confiança estava ao lado dele em cima da carroceria: o governador Ratinho Junior e o prefeito Rafael Greca. Em tempo: o vice Paulo Martins marcou presença. Todos os candidatos repetiram em seus discursos o que falam no horário político. Sim, ao vivo o eleitor tem a impressão que as promessas são mais verdadeiras, mas isso é para ser cobrado durante o mandato de quem vencer.

7:25Vale a pena soltar quem cumpre pena no lugar de Bolsonaro?

por Celso Rocha de Barros, na FSP

Se ‘velhinhas do golpe’ foram só massa de manobra, aumenta a culpa do mandante

Na última manifestação da Paulista, ali entre a hora em que Ricardo Nunes fugiu e a hora em que Pablo Marçal fez questão de chegar atrasado, Jair Bolsonaro discursou a favor de uma anistia para os golpistas de 8 de janeiro.

No fundo, apelou para o artigo zero de todas as Constituições anteriores à de 1988, que dizia que lei é bonito, democracia é legal, mas, quando a direita quiser dar golpe, está liberado. Ives Gandra lutou a vida inteira para que o artigo zero fosse recepcionado na atual Lei Magna.

Eu entendo que Jair defenda os golpistas presos.

Quem vai participar da próxima rodada golpista sabendo que os veteranos do golpe passado estão na cadeia? Quem vai atender à próxima convocação para invadir o STF sabendo que, em caso de fracasso, os militantes vão para cana e o Jair vai para uma mansão paga pelo Valdemar Costa Neto?

Todo mundo viu você fugindo para a Disney para preservar seu álibi, Jair. Todo mundo viu Eduardo fugindo para ver Copa do Mundo. Os idiotas acampados em frente ao quartel, e vocês dois lá, um fugindo de burca, outro vestido de Cinderela.

Por outro lado, a narrativa “velhinhas do golpe” cria dificuldades para Bolsonaro. Será que vale a pena soltar quem está cumprindo pena no seu lugar, Jair?

Quem defende a anistia argumenta que os golpistas presos são doces velhinhas que entraram no golpe achando que ali era um bingo.

Gente sem muita sofisticação política que teria sido usada como massa de manobra. Gente que teria entrado no ônibus achando que ia passar o feriado em Brasília, conhecer os monumentos, esfaquear o quadro do Di Cavalcanti, linchar jornalista, essas coisas que todo turista faz, e quando viu estava no meio de um golpe de Estado.

O problema é o seguinte: se os executores do golpe foram só massa de manobra, aumenta a culpa do mandante.

Se os golpistas do 8 de janeiro foram manipulados, quem os manipulou? Se sofreram lavagem cerebral, quem lavou? Se eram só peões em um jogo maior, quem era o rei? Se eram apenas soldados rasos, quem era o general?

Era você, Jair. Você e seus aliados políticos, que hoje estão lá no Congresso, felizes da vida, fingindo que não tentaram fechar a instituição que os sustenta. Você e os militares que fracassaram em tentar o golpe, mas ainda estão lá na fila da promoção para general.

Agora, se você e sua turma convencerem os juízes que não tiveram nada a ver com o 8 de janeiro, então a velhinha do golpe torna-se a vanguarda do movimento que tentou explodir o aeroporto de Brasília na véspera de Natal de 2022, que colocou os caminhoneiros para fechar estradas pedindo golpe, que conspirou com os quartéis para derrubar quem venceu a eleição, que colocou Paulo Figueiredo para ler manifesto de militar golpista na Jovem Pan, que convenceu Eduardo Girão a convocar a reunião de 30 de novembro no Congresso. Já dizia Carlos Marighella: a ação faz a vanguarda.

Se a velhinha do golpe foi capaz de organizar isso tudo sem ser, sei lá, presidente da República, ela é uma gênia do mal, Jair, ela é o Coringa, ela é o Lex Luthor. Pelo amor de Deus, tranquem essa facínora na cadeia e joguem fora a chave. Talvez fosse o caso inclusive de investigar se não foi ela que causou aquelas mortes todas durante a pandemia.