por Carlos Castelo
Era um dia como outro qualquer na América: filas intermináveis nos shoppings, discussões acaloradas sobre o direito de ter 72 armas por pessoa em casa e, claro, o Twitter em chamas.
Mas, por trás dos jingles da Coca-Cola, o sistema ruía. Primeiro, o dólar desvalorizou tanto que foi visto sendo usado como papel de presente na Bloomingdale’s. Depois, Wall Street virou um parque de diversões com montanhas-russas só de quedas.
Foi nesse cenário que o improvável aconteceu: o comunismo chegou aos Estados Unidos da América. Sim, o país que inventou o American Dream e os sanduíches com 3.000 calorias decidiu dar um basta. E o estopim não foi a fome. Não foi o desemprego. Foi a Black Friday.
Numa fatídica sexta-feira, os americanos, loucos por descontos de 90% em TVs de 85 polegadas, invadiram as lojas. Mas, em vez de lutarem entre si por aquele último liquidificador de $19,99, uniram-se em um abraço coletivo.
– Por que lutamos uns contra os outros por pedaços de plástico e chips? — gritou uma senhora com um carrinho lotado de airfryers — O Walmart não merece o nosso sangue! A Amazon não é nosso pastor! Chega!
Na mesma hora, viralizou no TikTok o vídeo da Senhora da Airfryer Revolucionária e, antes que o algoritmo pudesse censurar, 50 milhões de americanos estavam nas ruas, exigindo: “Propriedade coletiva para todos, menos para o Trump!”
O agora ex-presidente tentou reagir, tuitando de um bunker secreto (um porão do KFC em Miami):
– Os comunistas estão vindo pegar seus hambúrgueres. Sad!
Mas era tarde demais. As fábricas da Tesla começaram a produzir tratores em vez de Cybertrucks, e o primeiro iPhone do Povo (iPhone for the Masses) foi lançado: um tijolo com uma maçã desenhada a lápis, mas 100% gratuito e capaz de fazer ligações — se você encontrasse uma cabine telefônica.
O novo líder do movimento, um antigo entregador do Uber Eats, foi eleito Presidente do Conselho Supremo dos Estados Unidos Socialistas da América. Em seu discurso de posse, declarou:
– Companheiros, agora cada Starbucks será uma cozinha comunitária! E, sim, o café será de graça, mas só se vocês aguentarem o gosto!
A nova bandeira virou uma mistura do arco-íris do Pride com a águia americana segurando uma foice em uma pata e um martelo na outra.
O McDonald’s transformou-se em um restaurante vegano popular, com pratos como o Big Proletas Veggie e comemorações revolucionárias, sendo a principal delas o MarxDia Feliz.
Curiosamente, o único setor que permaneceu igual foi o de memes: memes nunca morrem. E o mais famoso deles mostrava Trump chorando, com a legenda: “Quando eu queria construir muros, eles construíram pontes para o comunismo.”
Moral: quando o capitalismo cava sua própria cova, não ganha 50% de desconto nem na pá.
(Publicado no Estadão)