6:57A lição do Aragão

por Célio Heitor Guimarães

Carlos Heitor Cony, ex-seminarista, jornalista, escritor, membro da Academia Brasileira de Letras, que nos deixou em 2018, era, sobretudo, um grande contador de histórias. Algumas incluídas em seus livros; outras, transmitidas oralmente, como aquela do Aragão, que ele contou, aqui mesmo em Curitiba, ao escritor neoparanaense José Castelo. É essa que hoje, por absoluto desânimo com o tema político-administrativo, e pela necessidade de preencher este espaço cedido pela generosidade do nosso ZB, recapitulo para os doze abnegados que ainda me leem.

Cony narrou que, quando estava no Jornal do Brasil, apareceu lá uma senhora dizendo que precisava de ajuda. Ela era diretora do Hospício Engenho Novo, dedicado aos pobres e indigentes, e queria que o pessoal do suplemento dominical, cujo forte eram as artes plásticas, fizesse uma matéria sobre uma exposição das pinturas dos loucos. Mário Pedrosa, que era um grande crítico teatral e chefiava a moçada, topou a parada e comandou todo mundo rumo ao Engenho Novo. Lá chegando, passaram em revista os quadros todos. Até que Mário empacou diante de um em especial e proclamou: “Esse aqui é um gênio, um Cèzane…”. Convocaram o autor. Era um tal de Aragão.

Pedrosa, que tinha os contatos dele, comunicou-se com o então ministro da Educação e foi feita uma exposição do Aragão, lá no Ministério, aquele edifício projetado pelo Niemeyer, com azulejos de Portinari, no Rio de Janeiro. Vendeu tudo. Aragão, então, segundo o Cony, pediu baixa do hospício, fez a barba, cortou o cabelo e se mandou para a Europa. Esteve na Espanha e na Itália. Por três anos, ninguém soube dele. Até que um dia chega novamente no jornal aquela mulher:

— Olha, eu vim aqui outra vez por uma coisa muito chata. O Aragão…

E enquanto Cony e seus colegas pensavam que ele estava rico, famoso, ela completou:

— …está na pior, preso numa cela solitária, não pode sair. Está furioso. Vocês dão uma palavrinha com ele?

E lá foram Cony e o pessoal do jornal.

— Aragão, você é um pintor!  –  disse Mário Pedrosa ao Cèzane do Engenho Novo. “Não pode ficar assim, tem de voltar a pintar”.

Aragão olhou para o Mário e respondeu de bate pronto:

— Eu pintei. Mas ninguém tomou providências…

Disse, então, Carlos Heitor Cony que com ele, como de resto com todos os escritores e jornalistas, ocorria mais ou menos a mesma coisa:

— A gente escreve, escreve, escreve e ninguém toma providências!

Sem a menor pretensão de comparar-me com o mestre ou com qualquer outro cultor da escrita, peço licença a Cony para usar também as sábias palavras do Aragão.

Depois de treze anos em O Estado do Paraná, por obra e graça do saudoso e insubstituível Mussa José Assis, desde fevereiro de 2011 tenho ocupado espaço neste blog. Nada menos de quatorze anos. Dou os meus palpites, critico gregos e troianos, com especial predileção pelos poderosos de plantão, no Executivo, Legislativo e até no Judiciário, na esfera municipal, estadual e federal… Tenho feito provocações, usado de sutileza e de ironia e sido até, às vezes, excessivamente atrevido e impertinente, confesso…

E o meu querido editor, Roberto José da Silva, o grande Zé Beto, não toma nenhuma providência, puxa vida!…

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