por Carlos Castelo
Natal. Aquele espetáculo anual de hipocrisia, embriaguez e lamentações, embalado em papéis que custam mais caro do que o presente em si.
Se o Natal fosse um objeto certamente seria um CD dos anos 90. E, assim como a anacrônica mídia hoje em dia, arranhada, fora de moda e relegada ao fundo das gavetas.
Não há dúvida: o Natal está fadado a um fim trágico e previsível.
Mas, antes de tudo, falemos sobre a magia natalina. Aliás, alguém já viu essa magia? Porque passei as últimas décadas pelos shoppings da vida no mês de dezembro e só vi mães exaustas, crianças exigindo brinquedos de milhares de reais e pais com a expressão de quem perderam a vontade de viver. Se existe magia, está escondida entre a décima-segunda prateleira de panetones e aquele Papai Noel da 25 de Março tocando saxofone que mais parece estar tendo um AVC.
Agora, um brevíssimo comentário sobre as músicas natalinas. Quem foi o gênio que achou que seria uma boa ideia tocar “Jingle Bells”, em looping, por 45 dias? Isso não é espírito natalino, é tortura. Nem Netanyahu e Bashar Al Assad chegaram a um ponto desses.
Aposto que, no futuro, quando arqueólogos alienígenas encontrarem registros do nosso 25 de dezembro, vão concluir que “Então é Natal”, na voz de Simone, foi uma arma secreta criada para dizimar a humanidade. E, francamente, não dá para dizer que estariam errados.
Quanto à ceia: por que raios decidimos que uma refeição de 14 pratos, incluindo peru seco o suficiente para usar como gesso na construção civil, é a melhor forma de celebrar o nascimento de um bebê em um estábulo?
Se há algo que também revela a decadência dessa festa (festa?), são os presentes. Todo ano é a mesma história: passamos horas escolhendo uma lembrança que será devolvida, ou trocada, assim que as lojas abrirem no dia 26. Quem se importa com carinho na atualidade, afinal? O importante é o cupom fiscal.
Mas o golpe final, assim como no caso do CD, veio com a contemporaneidade. O streaming substituiu o compact disc; e, pelo visto, a Amazon substituiu o Papai Noel. O novo trenó é um entregador, suado, deixando sua encomenda na porta, enquanto você informa o código de recebimento. E nem ouse comprar algo físico. Hoje em dia, o presente de verdade é um gift card. Porque nada expressa melhor “eu te amo” do que repassar a alguém o perrengue de escolher o próprio presente.
No fim, como já dissemos, o Natal está seguindo os passos do CD: outrora amado, agora cada vez mais ignorado, exceto pelos nostálgicos que ainda têm um tocador portátil.
E, pensando bem, talvez seja hora de deixar Santa Claus descansar. Quem sabe, daqui a uns 50 anos, a gente olhe para trás e pense: “Lembra do Natal? Que coisa doida. Ainda bem que acabou, que nem a pandemia.”
Até lá, espero que o leitor guarde bem seus últimos CDs – ainda podem valer alguma coisa no Mercado Livre em 2074.
(Publicado no Rascunho)