por Célio Heitor Guimarães
No início do ano, ao referir-me aos vícios que atormentam o ser humano, atribui ao fumo – o velho e tradicional cigarro e seus derivados – o pior deles. Disse ser mais fatal que o álcool, a cocaína, o crack e outras desgraças do ramo. Acrescentei que o tabaco é socialmente tolerável, está presente na banquinha ao lado e ainda é relativamente barato.
Alguns dos meus raros leitores não concordaram, argumentando que o álcool e as demais drogas injetáveis ou cheiráveis são muito mais perniciosas do que a nicotina. Vali-me, na ocasião, de pesquisas de laboratórios e de casos que acompanhei, inclusive de pessoas próximas, da família.
Volto agora ao assunto, depois de ler o artigo do médico e escritor Drauzio Varela na FSP, no qual ele expressa, em destaque, que “o cigarro não respeita as virtudes da pessoa, ataca à traição tanto justos quanto pecadores”.
Com a autoridade e o respeito que tem, Drauzio anota que “os malefícios [do cigarro] são tão numerosos que um fumante do sexo masculino vive 12 anos menos; se for mulher, serão dez anos de vida jogados numa cova”. E aduz: “As doenças cardiovasculares são campeãs de mortalidade no mundo inteiro. Das mortes por infarto do miocárdio que ocorrem na faixa dos 30 aos 44 anos de idade, 38% são atribuídas ao fumo”.
O Dr. Drauzio vai além e garante que mesmo os ex-fumantes correm risco. Revela que em ex-fumantes tidos como “light” (leve), só depois de dez anos é que o organismo fica igual a quem nunca fumou. Já para os que foram fumantes “heavy” (intenso), a recuperação é bem mais lenta. Só depois de 25 anos é que o ex-fumante atinge os níveis de risco dos que nunca fumaram. E dá o seu exemplo pessoal: “Eu, que fumei cerca de um maço de cigarros por dia por 19 anos, sou considerado ex-fumante ‘heavy’.”
Drauzio Varela parou de fumar há 45 anos e espera ter afastado o perigo. No entanto, faz questão de advertir que “o câncer de pulmão é mais vingativo”. Ainda que a sua incidência diminua gradativamente no decorrer dos anos de abstinência “a probabilidade de surgir parece nunca igualar a de que jamais colocou um cigarro na boca”.
Para quem não leu o meu texto anterior ou se esqueceu dele, recapitulo que pesquisas de laboratórios revelaram que, ao inalar-se a nicotina, através da fumaça do cigarro, ela é absorvida pelos pulmões e rapidamente atinge o cérebro pela corrente circulatória. No cérebro, a nicotina estimula a liberação de uma substância chamada Dopamina, que proporciona imensa sensação de prazer e bem estar ao fumante. Daí a dificuldade daqueles que a experimentaram de livrar-se dela.
Também já fui fumante. Como antigamente era moda, fumei dos 15 aos 30 anos, uma média de vinte cigarros por dia. Quando nasceu meu filho, olhando para aquele bebezinho no berço, tão alegre e saudável, indaguei-me como poderia ensinar a ele que o cigarro não prestava, se mantinha-o nos lábios. Naquele novembro de 1971 abandonei o vício. De uma só vez, definitivamente. Foi difícil? Sim, muito. Mas sobrevivi.
Por isso, garanto aos interessados que deixar do vício do fumo é possível. Custa, maltrata, tira-nos do rumo; às vezes, desespera. Mas é possível. Basta ter consciência, persistência e um bom motivo. Sou prova disso. E várias outras pessoas também são.
Apague essa xepa, irmão!
P.S. – E os cigarros eletrônicos, os malditos “vapes”? Além da dependência intensa, elevada e rápida e de todos os malefícios dos cigarros comuns, ocasionam problemas de saúde mental, como a ansiedade e a depressão, segundo pesquisa divulgada pelo InCor (Instituto do Coração), de São Paulo.
Fumei desde os 20 e poucos até abril de 2007 quando descobri o ebfisema pulmonar. Estou com 81.9.
Mas não chego aos 83.
Chega a ser irônico morrer por falta do que mais existe no mundo. E de graça. O ar.