por Carlos Castelo
Aos 40 anos, quando decidi assumir meus fios prateados, não imaginava que estava me filiando a uma seita urbana.
Na verdade, tudo começou quando percebi que gastar fortunas com tinturas estava se tornando um ritual mensal tão dispendioso quanto pagar um plano de saúde premium. Foi então que decidi: vou abraçar o meu diferencial genético de peito aberto.
O curioso é que, ao contrário do que muitos pensam, não foi uma decisão motivada por preguiça ou apenas pela economia em balayage. Foi uma escolha existencial. Afinal, por que deveria me envergonhar de algo considerado positivo por alguém como George Clooney?
O mais interessante é observar as reações. Há aqueles que me olham como se eu fosse um veterano de guerra que decidiu expor suas medalhas no peito. Outros parecem querer me apresentar a seus cabeleireiros com urgência. E há ainda os que me perguntam, com uma sinceridade desconcertante, se sou pai ou avô dos meus filhos.
Mas o melhor mesmo é o código secreto que existe entre nós, os grisalhos que saíram do armário. É como aquele aceno discreto que os harleyros trocam nas autoestradas. Não tão orgulhoso, um pouco mais melancólico, mas parecido.
Já as mulheres da minha idade parecem bastante intrigadas. Algumas me confessam que gostariam de ter a mesma coragem com seus fios brancos. Outro grupo menor demonstra uma admiração que beira o antropológico, como se eu fosse um filhote de pássaro dodô que decidiu não se camuflar na selva.
No trabalho, percebi que minha opinião ganhou um peso extra. Mais ou menos como se cada fio branco representasse anos de sabedoria acumulada, ainda que eu continue sendo o mesmo sujeito que, às vezes, esquece onde deixou as chaves do carro.
Minha namorada diz que fiquei mais respeitável, mas suspeito que seja porque agora pareço muito com seu pai.
O mais irônico é que nunca recebi tantos elogios sobre minha aparência quanto agora. É como se assumir os cabelos brancos fosse um ato de rebeldia contra o culto à juventude eterna. Uma forma silenciosa de dizer: “Estou virando um tiozinho, mas e daí?”
No fim das contas, descobri que não pintar os cabelos é como ter um superpoder social: as pessoas nos respeitam mais, confiam em nossas opiniões e, melhor ainda, sempre nos encontram com facilidade em lugares mais lotados que a rua 25 de Março. Quem diria que mechas brancas poderiam trazer tantos benefícios?
Em um mundo onde todos buscam a fonte da juventude, vou seguindo na contramão. Meu rosto vai ganhando rugas e sinais de senilidade, mas o espírito segue teimoso. É como se caísse neve no telhado, mas na lareira houvesse fogo. Quero só ver quando me chamarem de lenda urbana. Só uma conquista seria maior: eu começar a lembrar onde larguei as chaves do carro.
(Publicado no O Dia)