de Carlos Castelo
- Quando eu era adolescente, ficava contando os minutos para ir ao cinema. Meu pai tinha um empregado que fazia bico como porteiro, à noite, no Cine Gazeta. Um dia, ele me botou para dentro na fita (era assim que chamavam longa-metragem na época) A Piscina, com Romy Schneider (em pelo). Esse fato mudou minha vida. O cinema, para mim, passou a ser apreciar beldades nuas. De uns tempos para cá, as pessoas preferem assistir à violência: tiro de 12, granada, enforcamento, decapitação. E, quanto mais realista, e em close, melhor. Não sou antropólogo para saber o que houve com a sociedade para querer trocar a libidinosidade pela crueldade. O fato, contudo, está aí nas telas para todo mundo presenciar. Num mundo cada vez mais moralista, a nudez ofende, mas as serras elétricas são aplaudidas de pé.
- Não assisti ao filme Ainda estou aqui. E não pretendo vê-lo tão cedo. Nunca apreciei situações de manada. Como quando o Grande Touro da moda francesa ordena ao gado do resto do mundo a usar boinas e, do nada, passamos a ver todos os bovinos da Terra envergando um gorro no meio dos chifres. Por isso, ainda não fui prestigiar o tal filme. Não sou uma vaca, sou uma pessoa. Talvez eu vá um dia, quando as redes sociais pararem de invadir meu feed. Ou quando os algoritmos não me escolherem mais para mostrar a Fernandinha emocionada com as palmas em Cannes, o Selton Mello mais gordo, ou o Marcelo Rubens Paiva ostentando a camisa do Corinthians. Admito que é positivo nos lembrarmos de nossas feridas sociais e políticas. Em especial, quando o mundo e o Brasil parecem caminhar para uma versão piorada do feudalismo (com a diferença de que, em vez de cimitarras e catapultas, agora temos bombas atômicas). Mesmo assim, ainda estou aqui sem ver o longa. E daqui não saio, daqui ninguém me tira.
- As pessoas criam as mais engenhosas desculpas para justificar seus vícios. Eu, por exemplo, tive uma namorada que dizia fumar maconha para aliviar cólicas. Foi a única mulher que conheci que menstruava todo dia. Com a entrada das BET no Brasil, vemos muita gente criando argumentos para fazer uma fezinha. Alguns dizem que apostar exercita o cérebro. Já ouvi até um defensor da jogatina jurando que a adrenalina de uma aposta errada faz mais pelo coração do que o cross fit. Por outro lado, cada um sabe até onde vai o limite do seu cartão de crédito. No meu caso, ficar em mais do que uma rodada de bingo já é temerário. Mas, e você, vai pagar para ver?