por Carlos Castelo
As pessoas são tão difíceis de se amar; já os dicionários, por outro lado, são facílimos. Por isso, vivo com eles em lua de mel. Tudo começou com um antiquíssimo dicionário do vovô, herdado pelo meu pai. Só me lembro que se chamava Diccionario Prático Illustrado da Língua Portuguesa. O interessante foi que gostei mais das capitulares góticas de cada entrada e das ilustrações do que das palavras em si. Normal, eu era um pivetezinho de oito, nove anos. Só bem mais tarde entendi o real valor daqueles livrões. Então, passei a colecioná-los. Diferentemente do vetusto Diccionario, esses tenho comigo até hoje. São obras tradicionais, de rimas, de aforismos, de palavrões, de Pessoa, Machado. Um dos meus favoritos é dos pouquíssimos dedicados ao humor e sarcasmo: o Dicionário do Diabo, do norte-americano Ambrose Bierce (apelidado de Ambrose Bitter por razões óbvias).
O meu amor pelos léxicos foi crescendo tanto que terminei por escrever o meu próprio glossário: Dicionaro, o dicionário de Bolso. Na chave humorística, como quase tudo que invento, mas ainda assim um autêntico pai dos burros. E bota burro nisso.
No momento, estou envolvido em mais dois projetos ligados aos desmancha-dúvidas. O primeiro é uma grande compilação de frases de humor universal; o segundo, a continuação da escrita do Dicionário Castelo da Língua Portuguesa, um livro com verbetes totalmente voltados à mofa.
Agora, imaginem um cidadão tão ligado em palavras e seus múltiplos significados se encontrar, por um desses acasos da vida, com Mauro Villar, coautor do Dicionário Houaiss. Pois foi o que se deu comigo recentemente por intermédio de Rodrigo Villar, seu filho.
Na qualidade de redator publicitário, dei algumas ideias ao Instituto Antônio Houaiss no sentido de aumentar a influência de sua versão online. Sim, leitor, os dicionários de agora andam no interior de celulares, tablets e computadores. Foi assim que criamos perfis em redes sociais, apps, campanhas right sizing, Google Searches e coisa e loisa, a fim de comunicar a novidade. Tudo foi se azeitando e chegou o momento de rebatizar o livro. Sugeri a denominação Houaiss On. Foi aprovado por unanimidade e já ando por aí dizendo que fui o São João Batista do mais completo dicionário da língua portuguesa. Como perceberam, não estou me aguentando. Precisei até escrever esta crônica a fim de compartilhar a alegria por tão grande privilégio.
O novo nome foi acompanhado de um redesigncompleto da marca Houaiss. Você já pode vê-la, em todas as suas versões, pela internet. Para encerrar meu cabotino relato, termino com duas definições de felicidade: uma do Houaiss, outra do Dicionário do Diabo. O final em aberto permite ao leitor eleger a que melhor lhe convier no momento.
HOUAISS
substantivo feminino
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qualidade ou estado de feliz; estado de uma consciência plenamente satisfeita; satisfação, contentamento, bem-estar
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boa fortuna; sorte ‹para sua f., o ônibus atrasou, e ele pôde viajar›
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bom êxito; acerto, sucesso ‹f. na escolha de uma profissão›
DICIONÁRIO DO DIABO
(happiness), s.f.
Sensação agradável que surge ao contemplar a desgraça de outrem.
(Publicado no Rascunho)