por Carlos Castelo
Cresci ouvindo histórias sobre circos, e eu mesmo me tornei um aficionado pela arte de arena. Recordo-me de meu pai contando sobre o Circo Teatro V-8, um pequeno e humilde espetáculo com lonas remendadas, que se instalou na praça Landri Sales (a praça do Liceu), em Teresina, durante sua infância.
Sem animais, o circo atraía a plateia principalmente com as atuações do palhaço V-8 – apesar de suas piadas serem sempre as mesmas, me dizia o velho.
Após as apresentações, o espaço se convertia em um palco teatral, encenando peças que variavam entre dramas e comédias, essas últimas muito apreciadas pelo público.
Modesto em tamanho, o circo tinha capacidade para 60 espectadores mais abastados nas cadeiras, e 200 lugares no “galinheiro”. Mesmo em dias de grande movimento, era raro lotar por inteiro.
No pós-guerra, Teresina também abrigou outros circos, como o Grande Cirkus Fekete.
Anunciava a publicidade da época:
“As atrações principais do Fekete são os sete acrobatas húngaros; a trupe Mohamed – composta por dez árabes marroquinos e campeões saltadores… o saltimbanco Temperani… atletas cômicos ingleses…. seis cossacos; a equilibrista japonesa Mamica…o artista equestre alemão Herr Gauthier; cavalos, cabritos e porcos amestrados; os clowns Pão duro, Jacaré e Chimarrão e o cômico Zé Cupira”.
Aos 16 anos, seguindo o DNA paterno, me tornei amigo dos proprietários de um circo: o Família Fontoura. Sempre estava presente para assistir às exibições que ocorriam das sete às nove da noite.
Aos domingos, costumava visitar os bastidores, fascinado pelo estilo de vida nômade e simples daquelas pessoas, que muitas vezes não reconheciam seus próprios dotes artísticos.
O Família Fontoura permanecia em minha cidade por cerca de um mês e, ao longo de dois anos, voltou a se instalar na cidade mais duas vezes.
Os Fontoura – Genésio, Salete, a filha Flor de Lua e seu irmão Anquises – residia numa pensão nas cercanias de nossa casa.
Flor de Lua, em seus 18 anos, cabelos negros até os ombros e um rosto de beleza grega, era artista de circo por necessidade, não por escolha. Queria ser veterinária e cuidar dos animais, em vez de domá-los.
Eu, tímido e platonicamente apaixonado, ficava enfeitiçado em sua presença. Na minha fantasia de adolescente, ela era uma escultura de Fídias que havia ganhado vida.
Na última apresentação do Circo Família Fontoura, Flor de Lua sugeriu que eu a visitasse em Viçosa, reduto dos seus em Minas Gerais.
A sugestão inesperada despertou em mim o desejo de acompanhá-la na hora, até mesmo no circo. No entanto, ao racionalizar, percebi que não possuía aptidões artísticas e nunca poderia aspirar a um romance com uma mulher tão admirada.
Ao sair do picadeiro, recebi dela um beijo leve e carinhoso na face. Era o fim de um espetáculo e o início de um longo amor pelo circo.
(Publicado no O Dia)