15:56No palco e na morte

Entrei no palco. Estádio lotado. O palco também, mas o importante é que o show precisava começar. Tinha um microfone ali na minha frente e milhares de olhos me vazando. De onde vinham os acordes, não sei. Comecei a cantar. Se era rock, blues, samba, bossa nova, canção de protesto, não sei. Mas olhei direito o microfone e ele só tinha o invólucro de metal cinza que parecia o capacete do Nacional Kid. Minha voz, contudo, se espalhava pela imensidão de concreto. Olhei para o lado. Um não sei quem cantava, sem equipamento nenhum – e minha voz era que saía. Um garoto gordinho com cabeleira loira tocava algo como aqueles peças que são usadas para esfregar roupa nos tanques de pobres. Só que a dele era de metal. Lembrei dele. Há anos tinha sido assassinado a tiros quando trabalhava numa casa lotérica. Acordei com ele na memória. Juntos bebemos muito no tempo em que passarinho não cantava pra mim.

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