por Leonardo Bessa, publicado no UOL, no blog do Juca Kfouri
Betfair, Estrela Bet, Esportes da Sorte e Pari Match. Pixbet, Blaze, Sportsbet.io e MrJack.Bet. Novibet, Dafabet e Betano – esta última dá nome à atual edição da Copa do Brasil. Onze empresas, que bem poderiam ser uma escalação de time de futebol, mas na verdade representam o número de casas de apostas esportivas que patrocinam clubes da Série A do Campeonato Brasileiro de 2023. Dentre os 20 clubes que disputam a competição, apenas o Cuiabá não é patrocinado por uma casa de apostas. Se abrirmos o leque para a Série B, vamos encontrar mais empresas de apostas explorando os gramados brasileiros: PagBet, BetNacional, ValSports, Betfast.io e Bet7k.
Além de estamparem as camisas dos clubes, muitas vezes na condição de patrocinador master, como é o caso do Botafogo, líder do Brasileirão, apadrinhado pela Pari Match, que se apresenta na internet como uma “plataforma excepcional de apostas esportivas para apostadores ávidos”, essas empresas arregimentam jogadores em atividade e jornalistas como garotos-propaganda.
Marcelo, lateral-esquerdo do Fluminense, é o rosto de campanhas da Sportingbet, uma das maiores no segmento mundial. Vini Junior, do Real Madrid e da Seleção Brasileira, fechou patrocínio com a Bet Nacional. Galvão Bueno faz sucesso chamando as pessoas para “betarem” no Pixbet e celebridades da música e da televisão usam seu poder de influência em memes, como Betty Faria, que faz brincadeira com o próprio nome: “essa aposta a Bet Faria”, Beto Jamaica, ex-integrante da banda É O Tchan e ex-jogadores como BeBETo, também fazem alusão ao próprio nome, em trocadilhos para atrair apostadores. Bet, em inglês, significa aposta.
Em matéria publicada pela repórter Jenne Andrade, em 05 de abril deste ano, o Estadão trouxe reportagem sob o título: R$200 mil em dívida e depressão: histórias de viciados (sic) em apostas online”. Em resumo, a matéria traz casos de pessoas que perderam muito dinheiro, além da sanidade física e mental, em sites de apostas. E traz um quadro sobre o aumento do número da procura por internamentos clínicos para tratar da doença, tipificada como jogo compulsivo DSM-5, dependência em jogos de azar (sejam eles esportivos, ou eletrônicos em geral), pela Associação Americana de Psiquiatria.
Um entrave para que pessoas físicas que se sentem lesadas acionem judicialmente empresas de apostas esportivas é a jurisdição. A Betano, por exemplo, tem sede em Malta, na Europa, e não tem representação no Brasil. Assim como suas concorrentes diretas, a casa de apostas opera no país apenas por plataformas online.
A MP das Apostas Esportivas, editada pelo Governo Lula, traz pontos importantes, como o que estabelece que as empresas devem promover ações preventivas para conscientizar os jogadores a respeito do transtorno do jogo patológico, com o intuito de evitar que as apostas se transformem em dependência. Na prática, é uma boa iniciativa. Porém, como se daria isso para valer? Quem conhece os sites sabe que já existem botões de “jogo responsável”, mas é notório que eles podem ser facilmente burlados pelos próprios jogadores. Quem fiscaliza o apostador quando ele está “na ativa”, apostando para “recuperar o prejuízo”?
Analistas e educadores financeiros são unânimes ao avaliar que, em uma aposta esportiva, todo resultado é possível, inclusive o prejuízo. Portanto, nunca há garantias de vitória. E, para o apostador que começa ganhando, a grande ilusão é a de que aquele resultado se repetirá por muitas vezes, o que poderá torná-lo um dependente em 10 a 20% dos casos, em média.
Somado a isso, ainda temos visto muitos jogadores envolvidos em escândalos de manipulação de resultados recentemente, alguns deles também acometidos pela adicção, como é o caso do inglês Ivan Toney, do Brentford, da Primeira Divisão da Inglaterra, que atualmente cumpre suspensão de nove meses depois de betar contra o próprio time em casas de apostas britânicas. Ou de Alef Manga, dispensando do Coritiba por suspeita de manipulação de resultados, atualmente no futebol do Chipre.
Diante deste cenário, penso que a imprensa esportiva não deveria fazer parte desta onda que já tomou por completo as redes sociais. Tente abrir um anúncio no Twitter, Facebook ou Instagram sem que um pop up da Bet365 exploda no seu PC, tablet ou celular. Ou um vídeo no Youtube. Isso sem contar os anúncios de sites em geral. Então, ao menos que os comunicadores, que podem optar pelas empresas com as quais vão fechar contratos de publicidade, repensem antes de divulgar uma casa de apostas.
Ao divulgar um produto, você endossa o serviço oferecido por uma marca ou empresa, influenciando milhares de pessoas. Dizer que a responsabilidade é individual é uma meia verdade, visto que a linha que separa o jogo recreativo da dependência é muito tênue. E, claro, a decisão final por clicar no botão de apostar será sempre do “jogador”. Mas, quando o problema das apostas no Brasil sair de controle, não vai dar para tirar o corpo fora e fingir que você não fez parte do problema.
*Leonardo Bessa é jornalista, formado pela PUC-PR em 2006, e atua como voluntário em uma clínica psiquiátrica em Curitiba. Há três anos está em tratamento contra a dependência em apostas esportivas e outras adições.
Fantastica a matéria ……essas arapucas de CASAS DE APOSTAS é pior droga do mundo …….prefiro o jogo do bicho que vicia mas é bem leve em vista ……………jfeio
parabéns, Leonardo. Artigo exemplar. Agora, uma coisa pra mim gravíssima e inacreditável é que essa montanha de dinheiro simplesmente não paga imposto. Nenhum. Agora é que estão discutindo isso. Não é um absurdo tremendo? Os caras fazendo esse dinheiro todo rodar, ficando milionários e simplesmente não recolhendo nada aos caixas do governo para aplicação em programas do governo? Não entra na minha cabeça.