16:59Na primeira classe, com um desclassificado

Do Analista dos Planaltos

Voando de primeiro classe, no começo da semana, num voo dentro da América Latina, cuja tarifa não sai por menos de R$ 20 mil, tive a oportunidade de me sentar quase ao lado de um jovem goiano.

O indivíduo, tatuado, com um Rolex no pulso e roupas de marcas de grife, quase parecendo um outdoor de tantas que ostentava, pede um champanhe para relaxar e saca de seu bolso um iPhone 14 “zero bala”.

Contrariando o modo goiano de agir – que tem fala mansa e cuidadosa – este falava muito alto e, com seu possante aparelho celular, iniciou um diálogo com alguém do outro lado da linha. Transmitia instruções para que seu interlocutor acomodasse um novo colaborador ou empregado.

Em descompasso com seu “shape” ostentação. o goiano orientou os seguintes comandos para o seu preposto:
“Coloca ele – o novo empregado – na segunda casa, compra papel higiênico, um sabonete que dê para duas semanas e escova de dentes. Não liga a energia; compra vela e fósforo. Avisa pra ele os horários que serão entregues as marmitas. Avisa também que é proibido fazer fogareiro pra esquentar a comida e que não pode fumar lá dentro.

Prosseguiu: ele tem que pegar o Pedro todo dia as 07:30 e levar na escola. Fala para não atrasar.”

Tudo indica, pela teor e da parte da conversa ouvida, que ele recém havia conseguido um novo “faz tudo” e que o tal Pedro deva ser o filho deste “empetecado” e moderno rapaz.

Eu, que igualmente estava gastando uma fortuna na passagem, também estava com um Rolex no pulso, assim como uso roupas de marcas confortáveis, mas uma vez que não recebo patrocínio para isso, me recuso a expor essas gratuitamente. Então, tiro o meu IPhone 13 do bolso para dedilhar esse texto.

Para começar confesso que senti um certo asco desumano em relação a ele, pois o mesmo havia dedicado um “cuidado” ao seu novo empregado, que somente se dispensava num  passado distante, aos escravos.

Ora, ora, aquele reluzente e “distinto” cavalheiro ao mesmo tempo que portava vestimentas, relógio e apetrechos tecnológicos que somam mais de R$ 200 mil, estava sonegando ao seu novo “faz tudo” o uso de energia elétrica para iluminação, aquecimento de água ou mesmo para o aquecimento da comida.

Também me peguei pensando o quanto – qual percentual – deste sujeito repugnante ainda existe em cada um de nós que nos achamos mais evoluídos, mas que ainda carregamos conceitos culturais do passado colonizador e da tal mal defendida meritocracia.

Claro que essa reflexão ainda não me fará vender o meu valioso relógio, pois infelizmente, santo eu não sou. Porém, pelo menos, já evolui para tratar os meus funcionários com respeito, dignidade, além de verdadeiramente procurar cuidar de cada um deles.

Claro que também pensei que este sujeito vota no Bolsonaro e que hoje acredita piamente que o auxílio Brasil é um grande feito do seu glorioso mito.

Certamente ele já esqueceu daquela frase que sempre repetia anos atrás, com a autoridade que o fazia se sentir um intelectual de mão cheia,: “ O bolsa família é um absurdo, nós não podemos dar o peixe, precisamos ensinar a pescar”.

Não, não tenho dúvidas de que ele vota no Bolsonaro. Caso eu, muito remotamente, venha estar errado, ele, pelo menos, vota no Novo e defende incondicionalmente a Lava Jato.

Claro, mas agora sem nenhuma dúvida, ele torce para que o auxílio Brasil continue, pelo menos no estado de Goiás, já que assim – e quem sabe, não precisará mais mandar marmitas para os seus colaboradores. Assim, logo ele exigirá que eles comprem seus alimentos com os recursos federais. Afinal de contas, benefícios do governo devem sempre ser negados para os outros, mas aproveitados para si.

Para coroar com retumbante hipocrisia o triste episódio, no momento em que o comandante da aeronave anunciou que estávamos prontos para decolar, como um bom cristão, o indivíduo que acabara de sonegar iluminação e aquecimento de comida para o seu funcionário, fez um vistoso sinal da cruz.

6 ideias sobre “Na primeira classe, com um desclassificado

  1. Margarida

    No passado, no interior, a gente chamava esse sujeito que o analista descreveu de um “Jacu”, mas, pensando bem, estava sendo injusta tanto com a ave, quanto com o caipira desajeitado. O melhor mesmo é chamar um cara assim de babaca, exibido, cafona e atrasado, tal qual o presidente.

  2. Thiago

    Eu voto 22 e apoio o goiano. Quem estuda não precisa de favor, trabalha e ganha dinheiro.

  3. Gumercindo Saraiva

    Historinha fantasiosa de péssima imaginação. Só pode partir de alguém que não conhece as relações trabalhistas no campo / agronegócio. Sou agropecuarista a mais de 40 anos. Jamais um colaborador do agro aceitaria essa situação. As relações trabalhistas no agro são totalmente diferentes da relatada por essa mente que desconhece a realidade.. Vá conhecer a realidade e depois se manifeste. Como fake propaganda está na lingha do PT atrasado. Lamento que esse tipo de narrativa seja divulgado pelo Zé Beto.

  4. Ana

    E como tem sido de costume entre o eleitorado bolzonarista, achei que ia fazer “uma oração pelo país”. Tá difícil, gente!

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