por Thea Tavares
“Amanhã já é ano que vem”.
(Ano Bom, de Xe Casanova).
Seja pela literatura, seja pela teledramaturgia, muita gente conhece o significado para a imaginação ou à projeção de realizações da brincadeira de “faz de conta”. As intenções da criança e do adulto se confundem nesse exercício de fantasia, mas também de estímulo à materialização e organização das nossas ideias.
Proponho que brinquemos de fazer de conta que hoje já é 1º de janeiro de 2023: cada um de nós passou pelas festas de fim de ano, pode ter confraternizado, trocado presentes ou não, pode ter encontrado tempo para descansar, renovar as energias, refazer-se… Talvez tenha ensaiado um balanço da vida até aqui, ter refeito planos, metas ou pode ainda ter analisado e compreendido este momento vivido, apoiado pela maturidade de comparar com o que já sonhou antes, realizou, com o que teve ou não diante de si, na perspectiva de retraçar suas próprias metas. Pode até ter, naquele instante, se perdoado, se acolhido e se respeitado na integridade do que quer que tenha se transformado e se definido então.
A vida é esse movimentar-se constante e tanto melhor será se valorizarmos e soubermos tirar proveito de períodos programados de pausa, de reflexão e de compromisso com a execução cotidiana daqueles planejamentos esboçados no silêncio da escuta interior.
Mas, nesta brincadeira de faz de conta, é importante responder: que quadro teremos ao nosso redor nesse dia? Quem estará do nosso lado, no nosso pensamento e quem ou o que não fará mais parte dos planos futuros? O que nos levou e que atitudes nos transportaram para tal cenário? Se há pessoas, paz interior, tranquilidade, sorrisos, disfarces, saudades… Se o coração estará preenchido ou se acusará lacunas, se a consciência estará mais leve ou carregada, se apenas nos observa, se esperneia ou cala-se em anuência? O que vai ser da gente?
Será que nossa resposta virá numa ressaca brava, que tangenciará a assimilação do período sob o pretexto do descanso ou do entretenimento? Se renovar-se-ão as preocupações e angústias diante das incertezas ou atribulações do futuro por definições que nos fogem ao controle ou fruto das imposições assumidas por responsabilidades escolhidas ou convencionalmente aceitas e suportadas? A simples possibilidade de nos enxergarmos, seja como for, em 1º de janeiro de 2023 por si só é promissora. Afinal, ninguém de fato sabe se existirá até esse dia. E, se chegarmos até lá, que tal cocriarmos a realidade que queremos ou deveremos estar inseridos nesse tempo-espaço prováveis?
Tudo bem. E que tal ousarmos mais? Pollyanna entra em ação e desafia, com toda a racionalidade que nos mantém no prumo: que tal deixarmos de lado as previsões pessimistas, os medos, as inseguranças, aqueles pensamentos autossabotadores e empregarmos toda luz e esperanças possíveis nessa tarefa? Até mesmo sobre nossas sombras mais arraigadas e indigestas, iluminar é materializar o enfrentamento e a assimilação de saudá-las como essenciais nessa caminhada evolutiva. E que tal também empenharmos todas as fibras do coração nessa arquitetura sutil, a fim de inflamar os projetos com o calor da alegria? O dia a dia já dispõe de tantos dissabores… Por isso, é que exercícios com sonhos só devem ser nutridos com a sabedoria advinda da afetividade e daquela mágica amorosa e confiante que vem da natureza e dribla ou nos blinda das pauladas que forçam distanciar a mente do coração. Sermos divinamente inteiros!
“Põe quanto és no mínimo que fazes”
(Ricardo Reis/Fernando Pessoa).
Cada dificuldade nos ensina e sinaliza vazios a serem preenchidos, providos com nossa disposição de lutar por mudanças, melhorias e movimentações. Os sonhos e desejos têm de necessariamente serem pautados em beleza, simplicidade, aconchegos, confortos e promessas festivas. Senão, deixam de ser sonhos. Para cocriar, com os pés fincados no chão, pequenos avanços individuais e coletivos, nossas ações partem de motivações luminosas e que refletem o melhor da alma, a essência de nossa animação e humanidade.
Sinceramente, ainda não sei como me enxergar plenamente em 1º de janeiro de 2023. Só quero estar, como neste instante, transbordando a certeza, leveza e a tranquilidade de que vai ficar tudo integralmente bem, dentro da concepção e dos valores assimilados até lá. No que depender de atitudes, passos, trabalhos, foco e decisões, assim o será! Não transferir essa responsabilidade a mais ninguém é outro desafio delicioso e consciente a se assumir. Por que não dizer inédito e corajoso também?
Tem uma frase do cantor e compositor Xe Casanova, falada em entrevista para um jornalão, que é muito interessante e inspiradora. Ele diz: “o amor transformou a minha vida”, referindo-se ao momento de sua carreira em que se municiou de coragem para promover uma guinada de 360 graus e todo o universo tem conspirado para o sucesso da sua caminhada solo, sob apoio do “Rappa” Marcelo Yuka. O amor que ele encarou, absorveu e transmitiu nessa mensagem vai muito além das relações pessoais ou apenas românticas, é um estado de estima transbordante por todas as coisas, pequenos detalhes de tudo o que significa e representa a vida. Quando li sua frase e entendi o contexto, quis chegar a 1º de janeiro de 2023, daqui a alguns meses, com ao menos a percepção desse direcionamento transformador. E que o amor não nos falte no endosso de cada plano traçado e em cada etapa de sua execução.