por Lygia Maria
Mudanças de Freixo mostram que sociedade é incapaz de falar sobre legalização
Óbvio, como sabemos, é impossível ser eleito para o Executivo no Brasil defendendo a legalização das drogas ou se dizendo ateu. E as duas questões estão de mãos dadas, já que a principal motivação contra a legalização é moral e religiosa. Em recente pesquisa do Datafolha, 83% dos entrevistados acham que as drogas devem ser proibidas e 79% acham que acreditar em Deus torna as pessoas melhores.
A fala de Freixo se direciona principalmente à população conservadora evangélica, que, a cada eleição, cresce como grupo capaz de definir disputas eleitorais. Mesmo que o cargo de governador não tenha poder de legalizar nenhuma droga, a posição sobre o tema serve como um índice de avaliação moral para o eleitorado, assim como a crença em Deus.
A fala de Freixo é uma faca de dois gumes. Pode servir para que sua candidatura se aproxime do eleitorado conservador, mas pode gerar desconfiança: “Ele mudou de ideia ou está tentando nos enganar só para ganhar a eleição?”. Porém, o pior é ver uma questão tão importante ser tratada como mera moeda de troca eleitoreira. A sociedade brasileira se recusa a encarar o problema de frente, sequer debatemos o assunto e, assim, chafurdamos na ignorância.
Vários países estão revendo suas políticas de drogas. Canadá, México, e diversos estados dos EUA legalizaram a maconha, Portugal descriminalizou as drogas, enquanto o Brasil trata o tema como tabu, cego aos benefícios sociais e econômicos oriundos da legalização ou da descriminalização atestados de forma empírica nesses países e em pesquisas científicas. Como dizia Millôr, “quando uma ideia fica bem velhinha, ela vem morar no Brasil”. O proibicionismo é uma dessas ideias.
*Publicado na Folha de S.Paulo