Ivan “O Terrível” Lessa nunca escreveu um livro. Dizia que o tiro dele era curto. Antonio Maria não sabia datilografar quando lhe deram alguns minutos para produzir um texto de rádio – foi salvo por uma datilógrafa que ficou com pena e ele ditou tudo a tempo para a metralhadora da moça. Pensou nisso depois que a enésima pessoa perguntou quando iria escrever o dele. Há meio século datilografava, inclusive nos computadores que sempre chamou de Remington, mas não entendia essa impaciência alheia. Nunca pensou nisso. Tinha um segredo, contudo. Mas como iria contar? Sim, escreveu um, depois de sofrer como um cão danado por meses após a encomenda. Precisava da grana – e ela era muito da boa. No último minuto, se isolou do mundo e o parto foi de cinco dias. Só parava para comer algo e dormir. Não entendeu o que aconteceu. Talvez os meses anteriores foram de gestação. A coisa nasceu, ele entregou, pagaram, gostaram, mas não publicaram. Era história real. Começava com um tiro e tinha tiros lá no meio das páginas. Não sabe o que fez da grana. Sabe apenas que escreveu o que não era seu. Tiro longo perdido no tempo.