O advogado paranaense Luiz Fernando Casagrande Pereira abriu espaço na página de opinião da Folha de S.Paulo com o artigo “Distritão ameaça representatividade”. Ele esclarece que tal sistema é adotado em apenas quatro países do mundo -“todos de reduzida tradição democrática”, e defende a manutenção do sistema representativo. Confiram:
Distritão ameaça a representatividade
Apenas quatro países o adotam, todos de reduzida tradição democrática
É uma grande ilusão imaginar que a reforma política tem um papel messiânico na solução de todas as crises do país. A democracia, em qualquer modelo, é sempre imperfeita. Uma reforma política, ainda que multidimensional, pode muito menos do que se supõe. É importante reduzir expectativas.
Reconhecida a limitação de toda e qualquer reforma, é necessário evitar que modificações piorem o sistema eleitoral. Com a reforma em pauta no Congresso Nacional, há quem tenha voltado a defender o tal distritão. O modelo é a antítese da reforma necessária. O sistema proporcional merece ser mantido.
O principal problema do modelo de sistema proporcional brasileiro foi corrigido, com o fim das coligações na proporcional. Era uma excrescência, distorcendo o destino da vontade popular (o voto dado ao candidato do partido “A” poderia eleger candidato do partido “B”). No mesmo sentido, a votação nominal mínima acabou com outra disfuncionalidade. Agora é necessário fazer um número mínimo de votos para se eleger. O modelo brasileiro foi adequadamente aperfeiçoado e garante muito bem a proporcionalidade da representação.
Ainda há espaço, claro, para novos avanços. É possível discutir a opção brasileira pela lista aberta, por exemplo. E sem nenhuma dúvida é fundamental reduzir o vergonhoso déficit de representação de gênero. A exigência de percentual mínimo de candidaturas mostrou-se insuficiente. É necessário dar mais um passo, agora para garantir reserva de vaga nos Parlamentos.
A reforma política abre espaço para incrementar o modelo, em múltiplas dimensões. O risco é que também abre espaço para retrocessos. O distritão é a maior ameaça.
O site do International Institute of Democracy mostra que o sistema proporcional, no mundo inteiro, concorre com o voto distrital —puro ou misto. Agora, é importante deixar bem claro que o distritão, apesar da semelhança no nome, não tem parentesco com o distrital. O distritão é o distrital apenas com os defeitos. Um sistema adotado somente em quatro países, todos de reduzida tradição democrática.
O distritão acaba com a representação das minorias. Os partidos políticos —e suas ideias— saem de cena. Elegem-se os mais votados dos estados (o “distritão”), independentemente da filiação partidária. É um sistema que incentiva o personalismo, esvaziando o debate ideológico. Diferentemente do distrital (com os pequenos distritos), não aproxima o parlamentar do eleitor. E pior: desconsidera (joga fora) o maior número de votos. Todos os votos dados a não eleitos são descartados. No sistema proporcional, repita-se, os votos sempre contam para a legenda, convertendo vontade popular em mandatos.
É natural que muito reclamem dos partidos, uma instituição em permanente crise de confiança. Não é adequado, no entanto, escolher um sistema que deprecia o papel das legendas. A solução está em reformar o sistema partidário, outra dimensão da reforma. Democracias modernas não funcionam sem partidos políticos. O sistema eleitoral deve fortalecê-los —e não o contrário. O sistema proporcional entrega poder aos partidos; o distritão inverte a lógica, priorizando candidatos desvinculados de um conjunto de ideias.
É indigesta a tarefa de defender o modelo atual. O senso comum está contaminado pela ideia simplificadora de atribuir os problemas da política, sejam quais forem, a um sistema eleitoral inadequado. É um erro. A democracia é assim mesmo: imperfeita. É possível apenas deixá-la mais ou menos imperfeita. E o sistema proporcional é o menos imperfeito entre as opções disponíveis, especialmente se comparado ao tal distritão. É preciso proteger a democracia brasileira desse retrocesso.
*Luiz Fernando Casagrande Pereira é Doutor em direito pela UFPR, é coordenador-geral da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep)
Quais são os quatro países?
Pesquisando na internet achei três: Estados Unidos, Itália e Inglaterra.
Se for verdade o que está na internet, o tal “todos de reduzida tradição democrática” não é bem assim…
Será que é por isso que não aparece o nome dos tais países no texto dele?