12:05Duas lembranças

por Reinaldo de Almeida Cesar

Muita gente escreverá na mídia e nas redes sociais sobre Fabio Campana. Também quero registrar meu pranto de amizade e admiração, nessa hora difícil da sua partida. Convivi intensamente com ele no primeiro governo de Requião. Ele, secretário de Comunicação e eu, muito menino então com 25 anos, tentando ser um aplicado chefe de gabinete do Governador. Aprendi muito com o Fabio, ouvindo seus aconselhamentos ou apenas observando-o. Desse tempo, registro duas passagens entre tantas outras, que ilustram a aguçada inteligência e a fina ironia, notas marcantes da sua personalidade. Já empossado governador, Requião decidiu ir à posse de Joaquim Roriz. Seguimos para Brasília, Fabio nos acompanhou. Nos salamaleques próprios das solenidades, lá estava o dispositivo militar. Ao prestar continência, o chefe da Casa Militar do DF, apresentou-se. Ato contínuo, Requião então me apresentou como seu chefe de gabinete e, em chiste, apresentou o Fabio, como sendo o “Coronel Campana, chefe da minha casa militar”. E saiu de perto, em riso contido. O coronel da PM do DF se entusiasmou em encontrar sua contraparte e tentou puxar conversa. Com raciocínio rápido, semblante sério e com aparente constrangimento, Fabio logo o interrompeu dizendo “olha colega, sinto muito, não tenho muito o que compartilhar. Sou Coronel-músico, comando a banda da PM do Paraná. Toda minha vida militar foi na banda. Nem sei porque o governador me escolheu. A PM está em polvorosa”. Bastou isso para o coronel brasiliense se retirar, até com certa pressa. O segundo relato é mais denso, com carga emocional. Na véspera da posse, exatamente um dia antes, Fabio entra na residência de Requião segurando sua inseparável pasta de couro preta. De lá, tira o discurso que havia escrito para que fosse lido por Requião, na posse. Requião coloca os óculos, começa a ler e, muito emocionado, enche os olhos de lágrimas. Texto lindo, costurado em torno de reflexões sobre “de onde eu venho, para onde vamos”. No dia seguinte, após fazer algumas pequenas alterações, Requião leu o discurso na posse e, novamente, se emocionou, marejando os olhos e embargando a voz. Fabio Campana foi a única pessoa que vi falando a um sempre atento Requião, sem ser interrompida. Os textos do Fabio são impecáveis. Linguagem escorreita, cativante. Há muito tempo eu não o encontrava. Há alguns meses, o meu fraterno amigo José Maria Correia esteve com o Fabio e depois me disse que haviam falado também sobre mim, deixando marcado um encontro para quando passasse esta triste pandemia. Fabio havia pedido para “levar até ele o Reinaldinho”, como sempre me tratou, com imenso carinho. Ao me contar sobre isso, fiquei imaginando como seria maravilhoso estar com Fabio Campana, José Maria, Geraldo Seratiuk e Romanelli, como personagens proustianos, não à procura de um tempo perdido, mas no resgate de um tempo maravilhoso que se foi. Essa tertúlia ficou adiada. Deixo meu abraço solidário à Denise – companheira de toda uma vida, aos filhos Izabel e Rubens, e ao seu amado neto Antônio. Fará falta o Campana.

Compartilhe

Uma ideia sobre “Duas lembranças

  1. Paulo+Motta

    Reinaldo de Almeida César; sempre uma palavra de afeto aos amigos passados, presentes e futuros. Gente da mais alta qualificação que dá orgulho de ter como amigo.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.