por Mário Montanha Teixeira Filho
Célio Heitor Guimarães é figura única, inconfundível. Só ele, mesmo, virginiano convicto, para fazer o que fez: diagramar um livro inteiro, detalhadamente ilustrado, e encomendar a uma gráfica alguns poucos exemplares da obra concluída, para distribuição restrita a seus amigos. Diagramar é maneira de dizer, expressão pequena para se referir a um trabalho tão meticuloso. No folheto explicativo que acompanha o livro, uma informação impressionante (apenas para quem não conhece o seu autor): “Eu mesmo fiz a pesquisa, coletei dados, escrevi o texto, reuni as ilustrações, diagramei e montei a edição, no sistema ‘word’ do computador”.
Pois o que o Célio exibe, a partir da aplicação do sistema “word”, é uma profusão de imagens e textos que se harmonizam, explicam e encantam. Preciosidade pura, abrigada em 160 páginas cheias de cores e movimento. Nelas, a história dos quadrinhos vem desde o começo, há mais de 120 anos, com o personagem Yellow Kid, que eu não imaginava existir. Assim como desconhecia os muitos artistas que se dedicaram à tarefa de dar vida e enredo a personagens fantásticos, criaturas sobrenaturais e romances improváveis.
Os quadrinhos talvez ainda careçam de reconhecimento, o que é uma bruta injustiça. Está certo o Célio, que não se preocupa muito com os que tentam reduzi-los a “coisa de criança”, no sentido de manifestação cultural menor. “O significativo”, diz, “é que eles [os quadrinhos] existem, já faz algum tempo, e divertem para valer, grandes e pequenos”. E dá a receita: “Precisam, apenas, ser lidos sempre com espírito infantil, aberto e desarmado, para que deles se extraia o que têm de melhor”. Para provar sua tese, o Célio oferece dados que, para mim, que fui gentilmente presentado com uma dose desse trabalho monumental, confirmam impressões que sempre tive, mas que não sabia traduzir.
Os quadrinhos fizeram parte da minha infância. Eu os lia compulsivamente, hábito que se estendeu até o início da fase adulta. Separei-me deles sem motivo aparente, sem perceber. Aos poucos, as pilhas de “revistinhas” que habitavam os quartos da minha juventude ficaram menores, até que desapareceram. Restou a lembrança dos detalhes dos desenhos, dos diálogos curtos sustentados por “balões”, das capas, das edições especiais. Enxergava-me a montar aqueles pequenos volumes, a distribuí-los, a criar aventuras inéditas.
Sucumbi, porém, aos padrões estéticos da modernidade – da televisão, primeiro, e depois das redes sociais, que dominam tudo. Ou nem tanto assim. O livro do Célio, que devorei com curiosidade enorme, no final do ano passado, fala de arte e comunicação, coisas que não morrem, ainda que golpeadas pelo vazio da tecnologia. Há motivos para se perder a paciência, sem dúvida. “Desesperados com a queda das vendas, eles [os editores] enlouqueceram”, reclama o autor. “Aboliram a retícula e passaram a produzir gibis pelo computador; repaginaram os heróis, descaracterizando-os e extraindo-lhes a essência”. Mas haverá quem resista, os teimosos dos quadrinhos. Formo com eles, e me integro, ainda na condição de aprendiz, à legião dos inconformados, como a cumprir uma dívida com o meu passado.
O livro do Célio Heitor se chama “HQ: a arte que está no gibi”. Guardo-o com carinho, em lugar especial e seguro, sem pensar em seu único, grave e imperdoável defeito: a baixíssima tiragem, opção de quem o escreveu. Recomendo a leitura, evidentemente, mas o meu exemplar não está disponível para empréstimo, protegido pelo ciúme que o mantém sempre ao meu alcance e sob o meu controle. Daí o pedido: que venham mais edições dessa obra fundamental. O mundo dos leitores, tão carente de boas iniciativas, agradecerá.
“Da Montanha” continua generoso e exagerado ao referir-se a este seu velho companheiro de ideal e de luta. É uma das pessoas mais competentes e decentes com quem tive a honra de conviver. Fomos colegas no egrégio TJ/PR, deixamos lá a nossa marca, nem sempre reconhecida e acatada pelos donos do poder – exatamente por ter sido bem intencionada, eficiente e correta. De todo modo, queiram ou não, fizemos história no Judiciário paranaense e isso não pode ser apagado. Obrigado, meu querido amigo. Muita saudade.
A exemplo do “Da Montanha” fui um dos 50 privilegiados que recebeu a Obra Prima do Célio. Muito embora insista que é sua “obra póstuma”, o que seria rematado absurdo, os leitores do Célio, que ele humildemente insiste que são 15, por certo serão brindados com outros livros da sua lavra.
O trabalho do Célio, conforme aduz Montanha, é realmente sensacional.
Li de uma assentada em dezembro e agora estou relendo com calma, um personagem por dia, buscando mais informações no Dr. Google sobre os mesmos, seus desenhistas, autores do roteiro e etc.. O Google, conforme estou notando, precisa aprender mais sobre HQs com o Célio.
Como tiver oportunidade de dizer ao Célio, chorei durante a leitura, relembrando que fui alfabetizado por minha mãe Fernanda através do Pato Donald e do Zé Carioca.
Muito embora o Célio tenha tido a pachorra de dar o ano de lançamento e o nome da(s) editora(s) que publicaram os personagens no Brasil, é evidente que o maior número de gibis foi publicado pela Editora Abril.
Da indicação do Célio li “O império dos gibis: a incrível história dos quadrinhos da Editora Abril”. Lamentável o que fizeram com o sonho do velho Victor Civita. Seu filho, Robert, resolveu brincar de televisão e jogou pela latrina mais de 1 bilhão de dólares. Seus netos, Gianca e Victor Neto, não renovaram os direitos de publicação com a Disney, Marvel e DC. Com a editora em estado falimentar venderam a mesma por míseros 100 mil reais, mais a dívida.
O novo dono, provavelmente por desespero, vende assinatura da Veja pela internet, a R$ 2,50 por semana.
Santo Deus. O que fizeram com a Abril. Gastei quase todas as minhas mesadas com publicações da Abril. Não me arrependo.
E que o Célio continue publicando muitas outras obras póstumas.
Afinal, nos dias de hoje, ter 80 anos é ter idade de guri.
Paulo Roberto Ferreira Motta
Taí mais um velho camarada, companheiro de luta e ideais. Isso está parecendo um “negócio entre amigos”. Parece e é, pois como diz o saudoso Rubem Alves, “quem tem amigos, nunca está só”. Os meus são poucos, mas todos exagerados. De todo modo, obrigado, meu querido Paulo Roberto. E viva o seu Internacional, o grande colorado do Sul!!!
Lançada a campanha: Aumento de tiragem, já! ou: Por uma nova edição, já!
Sobre gibis: Li-os todos: Ai, Mocinho! Roy Rogers, Zorro, Flash Gordon, (Allan) Rocky Lane, Durango Kid, Capitão Marvel, Capitão América, Fantasma, Mandrake, Pato Donald, Ken Maynard, Tom Mix, Kid Cold, Billy The Kid, Super-Homem, Jim das Selvas, Batman e Robin, Recruta Zero, Zé Carioca.
Quando não tinha dinheiro para comprar, roubava-os na banca da dona Severina, colocando-os disfarçadamente na bolsa da escola. Ela, também disfarçadamente, fazia que não via, anotava-os e os colocava na conta da minha mãe, ao lado de Grande Hotel, Capricho. E, proibido de lê-los, armazenava-os no forro da nossa pensão, a primeira em Santa Isabel do Ivai, ano 52 – Pensão Nossa Senhora da Conceição. Que, descobertos, foram incendiados. Se os tivesse hoje, os trocaria por um gol zero, na orelha.