DIÁRIO DA PANDEMIA
(*) Me orientem. Ainda estamos na fase de declarar guerra aos Estados Unidos ou já superamos esse lance? Gosto de ficar informado. Porque, se ainda estamos de mal, devo ir catando meus coquinhos de butiá e mamonas assassinas para estilingar o inimigo. Ouvi dizer que a bronca agora é com a China. Macho pra caçamba esse capitão. Brigar (sem motivo) com as duas maiores potências do mundo. Será um problema de impotência?
(*) Reassistindo as novelas da Globo, que já havia degustado quando eram virgens. os atores voltaram a ser jovens. Aqui o tempo não passou. Por um momento não penso na pandemia, foi tudo uma novela, estamos todos vivos. Como nas novelas onde o ator sacrificado reaparece vivo adiante, em outra contagem. Como se a vida estivesse voltando para trás. Mas, é tudo fantasia. Ou não. Talvez seja um aviso: estamos voltando para trás. À frente existe apenas este abismo em cujas bordas nos equilibramos. Se voltamos para trás talvez pudéssemos reescrever as histórias. O cabo austríaco está na prisão inventando sonhos cruéis. Ninguém começou ainda a caçar negros na África. O planeta ainda não é redondo. No aconchego do sofá, vendo antigas novelas, entendo que não se pode mudar uma história que já foi contada.
(*) Não sabia que se criava abelhas neste condomínio. Cuerbo Morales estava à janela e gritou para mim: “vem ver, vem ver!” Fui, se não essa ave de arribação não sossegava. Fui e vi o garoto do capitão, aquele com quem se ofura, e roubam minha água. E o que foi que eu vi? Vi o adolescente coberto da cabeça aos pés com aquele vestuário que os apicultores usam quando vão ordenhar as abelhas. Viu-nos, a mim e a ave, à janela. Acenou com a mão. Morales fez cara de vespa pra assustar o rapaz. Logo atrás vinha o capitão. Trajava um lance que nem vou ter coragem de descrever. Vou, sim. Era tipo meia burka. Sobre um chapéu de aba larga descia um pano prato que lhe ia até a cintura. Da cintura pra baixo, tudo normal. Cuerbo Morales não se conteve e gritou: O que é teu tá guardado.
FRASE TALVEZ PROFERIDA PELA PRINCESA ISABEL: Ô escravo, me cate ali no terreiro uma pena de ganso, que essas penas de ema estão todas croroquinadas.
KKK adorei o último parágrafo, mas a princesa Isabel nunca disse frase nem parecida com esta, porque a família real não tinha escravos. E os escravos dados à Corte eram logo em seguida libertados pelo imperador, que era abolicionista.