Um cacto se fixou em meu olhar
E fez uma ferida
Escondida debaixo da retina
Sangrei a primeira gota
E a sorvi com o mel na mesa
Me debati com o gosto
Vermelho do meu rosto
Dourado como o sol no céu
E foi um mundaréu de milagres
A viagem mais bonita
Pelas vias da ferida
Olhei o mundo por dentro
Ais, gozos e lamentos
E um firmamento a se pendurar
Debaixo de minha língua
A míngua de minha saliva
Já pedia mais do mesmo
Uma gota do olho cego
Que só via coisas bonitas
E que, lá dentro, viu a lua vazia
Tudo desarrumou-se
Na minha idolatria
Não tinha mais o gosto
Do que antes bebia
Um brinde à poesia
Falou a ideia que já se ia
Quando eu bebi da minha própria
Fantasia
Olhei de perto o chão
Onde tudo caía
Anjos, cães, vilões
E eu ainda sentia
Que o começo ainda nem chegou
E já era muito tarde
Pra quem se despedia
Uma canção me alcançou
Quando o gosto se esvaía
Peguei meu violão
E pus-me a cantar naquele dia