9:58Ser bipolar

por Patrícia Iunovich

Autenticidade versus sobrevivência. Quando você pensa que sua alma está repleta, plena de amor, mas, invariavelmente, descobre que sua percepção pode estar míope, é preciso recolher as sobrinhas, reconectar e aprender mais uma, duas, três vezes, que a vida é cheia de decepções. Você cai, levanta, e quando isso acontece nem sempre consegue manter o equilíbrio por um tempo que seria razoável para qualquer reles mortal. É químico. As pessoas bipolares sofrem todo tipo de discriminação. Elas incomodam.

Quando estão na fase da euforia, a da mania, preenchem espaços que não lhe convém. São aceleradas. Quando a ciclagem muda, entra em decepção, são mais fáceis de lidar. A que custo para elas? Ah, quem se importa. E aqui não se trata de vitimismo.

A literatura mostra: muitos bipolares não chegam a lugar nenhum, a não ser ladeira abaixo. A sociedade fecha suas portas e você corre o risco de ser apenas um rótulo. E desacreditada. Não é fácil conviver com um bipolar, eu sei, convivo comigo, mas acredite: ele está sempre cheio de amor, não é e nunca será um hipócrita.

Não é da natureza dessas pessoas serem dissimuladas. Calar-se. A maior mentira é a delas mesmos com elas. É ser tão gigante que não cabe em si. Parecem que vão implodir. Gigante de sentimentos confusos e dores da alma. Cultiva amores inexistentes, sonhos que nunca se concretizam, projetam tudo no amanhã. Precisam se monitorar o tempo inteiro. Geralmente falam alta, soltam todo tipo de palavrões, quebram tabus. Incomodam.

Sensibilidade é confundida com loucura, exagero. É compreensível. Só damos as mãos a quem queremos. O pior é quando de quem você menos espera, vem a crítica vazia, sem acolhimento e nada educativa. Apontar o dedo na cara do outro pode ser fácil, criticar pelas costas também. A questão é o momento certo de colocar as cartas à mesa, dar feedback, apontar problemas e dar sugestões. É exaustivo. Não há nenhuma verdade maior do que a interior, porque todos têm nós temos nossas razões. Mas o bom senso deve prevalecer. O coletivo ser o foco. É uma questão de resistir mais um dia. E nesse universo cultivar relações, quebrar a cara, recomeçar e seguir em frente. Porque dentro e fora de casa, estamos todos vulneráveis. Alguns enfrentam tudo isso com mais inteligência emocional do que os outros. Eu tenho um anjinho que, aos 23 anos de idade, conhece e sabe mais de mim do que muita gente que mantenho amizade há anos. Agradeço ao meu filho por sempre estar presente e, aqui, me refiro semanticamente à palavra. Ele está sempre por perto em alta vigilância. E me pega pela mão quando eu estou escapando já sem rumo. Quando não enxergo nada que valha a pena. Amo você. Obrigada, filho. Minhas Fridas não são meramente questão de estilo; são símbolo das chagas que carrego tanto da fibromialgia quanto da minha alma inquieta.

Uma ideia sobre “Ser bipolar

  1. Ticiana Vasconcelos Silva

    Patrícia querida,
    Expor o que sentimos é um ato de coragem e também de sabedoria. Minha alma acolhe a sua inquietude e se identifica com as partes que não são compreendidas por quem não sabe o que é carregar uma doença ao longo da vida. Eu carrego a minha, extravaso excessos, tento viver de maneira mais leve. Mas as emoções nem sempre estão ao nosso alcance, porque são a alma. E quando ela fala, nós ouvimos.
    Um grande abraço da filha do Zé Beto

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