por Diogo Cavazotti Aires
Há poucos anos, o colombiano Luís Miguel Bermúdez, eleito um dos melhores professores do mundo em 2018, ministrou uma aula sobre abuso sexual. Após explicar como identificar e denunciar o crime, quase metade das adolescentes começaram a chorar. Elas tinham acabado de descobrir que haviam sido abusadas, algumas delas por próprios familiares. É possível concluir que, caso tivessem acesso àquelas informações mais cedo, as jovens poderiam tentar evitar o crime e o trauma. E isso se faz por meio de educação sexual nas escolas, de acordo com a idade de cada aluno e aluna.
Diversos tratados internacionais de direitos humanos abordam a importância do tema como forma de desenvolvimento pessoal e econômico para os países. Para citar apenas alguns, a Convenção sobre os Direitos da Criança, de 1990, fala sobre a necessidade de se adotarem medidas para protegê-las contra violência sexual e maus-tratos. Na Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento das Nações Unidas, em 1994, o tema educação sexual foi debatido e visto como uma das formas de atingir os objetivos mencionados para melhorar a vida da população. Da mesma forma, a Conferência Internacional da Mulher de Beijing, 1995, propôs garantias, incluindo a educação e promoção da saúde sexual e reprodutivas. Entre os programas de desenvolvimento da Organização das Nações Unidas, as estratégias para a juventude entre 2014 e 2017 indicavam a necessidade de investir em educação sexual e reprodutiva e serviços de saúde especialmente desenhados para a juventude. Todos estes tratados foram ratificados pelo Brasil.
Esta semana houve uma votação de um relatório do Conselho de Direitos das Nações Unidas sobre discriminação contra mulheres e meninas. O documento foi proposto pelo México e propunha orientar os países a tomarem medidas efetivas para proteção e desenvolvimento deste público. Entre os tópicos estava o melhor acesso à educação sexual. O relatório foi aprovado por dezenas de nações ao redor do mundo, mas algumas resolveram se abster da votação, demonstrando insatisfação com as prerrogativas. Entre elas estavam Somália, Afeganistão, Líbia, Sudão e Brasil. Sim, estamos ao lado de nações que possuem um conhecido histórico de violação aos direitos das mulheres.
Esta atitude não chega a ser uma surpresa. As recentes opiniões e programas nacionais ligados aos direitos humanos pregam iniciativas arcaicas, como o incentivo à abstinência sexual como forma de evitar a gravidez na adolescência. Talvez esta recomendação funcione para uma parcela das jovens, mas nem de longe representa a realidade de toda a população. O que falta no Brasil atual é a capacidade de colocar-se no lugar dos cidadãos que vivem em diferentes realidades.
Para alguns pode ser difícil entender, pois colocou-se no imaginário popular que educação sexual é sinônimo de erotização infantil. Mas o tema trabalhado com conhecimento e responsabilidade, ou seja, por educadores, contribui para nos conhecermos em nossa integralidade. Funciona como o início de um processo. Desta forma, temos menos episódios de depressão, bullying, suicídio, abuso, violência, masculinidade tóxica e, no futuro, menos casos de violência contra a mulher. Claro, menos jovens grávidas, que continuarão nos estudos e poderão optar, se quiserem, por engravidar em um momento mais interessante para elas. Com mais tempo de estudo, podem ter melhores condições de trabalho. Também menos doenças, gerando menos atendimento e gastos ao sistema de saúde, e mais vagas para pessoas com outras enfermidades. Tantos benefícios interrompidos por política e ideologia.
*Diogo Cavazotti Aires, mestrando em Direitos Humanos e Direito Internacional Humanitário pela Universidad Católica de Colombia.
Obrigado pelo prestígio, grande Zé!
Parabéns pelo texto, Diogo Cavazotti.