DIÁRIO DA PANDEMIA
- Nos invernos do passado eu tinha como agasalho acolchoados de penas que minha mãe fabricava. As noites eram tranquilas, sem tiritares de frio, sem bate-queixo, nem nada. Dormia ilhado nas penas que minha mãe nos provia. Hoje, na frialdade das noites, não consigo descansar ouvindo os quem-quem das aves que perderam a cobertura para eu me agasalhar. Pedem de volta suas penas, as penas que já nem tenho, as penas que apenas sinto.
- Minha professora de Português do tempo de ginasiano me aparece vestindo um penhoar, os cabelos cheios de bobes e a cabeça encoberta por lenço protetor de bobes. Ela veio porque me escutou dizendo “lágrimas me saíam dos olhos…” – E de onde mais poderiam sair lágrimas, pedaço de um burro? Das orelhas? Desciam-lhe as lágrimas dos ouvidos. Ou do nariz? Ou desciam-lhe melecas dos olhos? Assim como veio, ela se foi. Além da alegria de revê-la ficou outra alegria – saber que ela ainda era minha professora estivesse onde estivesse.
- Tinha o hino da cidade. Palmeira, endêmico rincão. Dona Maria, o que é endêmico? Endêmico é o teu cérebro, pedaço de um burro. É edênico. Do Éden, do Paraíso. Com boas auras tutelas nosso lar. Dona Maria, o que é tutelas? Ele me olha do fundo da vida: Olha se eu tiver que voltar outra vez vou tirar um ponto na nota da prova.
Os acolchoados de penas não tinha vírus corona,mas o que tinha de “piolhos’ rararararara.
Texto de se ficar sete palmos acima do chão.
Maria a quem se refere o Padrela era Maria Jamur, minmha prima e também minha professora de português no Ginasio Jesujino Marcondes, na década de 50. Nesse tempo fui locutor aprendiz na Radio Ipiranga , onde convivi com Gabriel Carazzai, Sergio Teizxeira, Ismaiel Freitas, Julio Soares da Silva e Omotir Assad que me levou para frente do microfone.