por Maria Hermínia Tavares
Responsabilidade fiscal não deveria impedir responsabilidade social
Falando na semana passada a estudantes de pós-graduação da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo, o governador do Maranhão, Flavio Dino, sustentou que o necessário compromisso com a responsabilidade fiscal não deveria impedir outro —também premente— com a responsabilidade social. Esta última, advertiu, exige que se pense em políticas de proteção social a mais longo prazo, aptas a lidar com problemas que hoje apenas se anunciam, mas que virão a galope, trazidos pelas grandes mudanças na economia e no mundo do trabalho.
Ao governador do PC do B preocupa a propagação avassaladora da informalidade e do trabalho precário –intermitente e, em regra, mal remunerado. Ele se inquieta com o seu previsível impacto sobre a Previdência, os programas de transferência de renda e o sistema de saúde pública.
Ainda bem, até porque esse enfoque está a anos-luz da retórica e das propostas dos economistas do governo, enquanto boa parte das oposições se limita a jogar apenas na defensiva —o que pode ser necessário, mas é claramente insuficiente.
A mesma preocupação infunde o relatório, publicado em fevereiro, do Diálogo Inter-Americano, think-thank de Washington dedicado ao debate de questões relevantes para o continente.
Coordenado pelo economista, ex-ministro e ex-senador chileno Sergio Bittar, “O futuro do trabalho: qual será o impacto da digitalização e o que fazer?” é uma cuidadosa revisão do conhecimento até agora produzido a respeito das consequências, sobre os mercados de trabalho e as instituições que o regulam, das transformações tecnológicas ligadas, entre outras coisas, à automação e à inteligência artificial.
Foram revistos 15 textos, uns de fôlego, outros mais limitados, mostrando que, apesar do consenso sobre o sentido e o alcance das mudanças, há muita discordância no que diz respeito às dimensões da destruição de postos de trabalho e da criação de novas oportunidades.
O relatório Bittar é moderadamente otimista. Mas enfatiza a importância de políticas públicas para modelar a mudança, reduzindo desigualdades; amortecendo os choques da transição para novas formas de organização da atividade; educando e requalificando as pessoas para novas oportunidades e profissões; e garantindo a sobrevivência digna dos que forem deixados para trás.
No Brasil assolado pela crise fiscal, a modorra econômica e os sobressaltos políticos em série produzidos por um presidente errático e desprovido de qualquer noção do que de fato conta para o país, aquela discussão pode parecer ociosa e remota. Não é uma coisa nem outra.