por Andreza Delgado, na FSP
Políticas punitivistas reforçam o papel do Estado como principal agente da repressão
Uma parte da esquerda faz tempo investe na difusão de uma narrativa específica sobre 2013 como origem do golpe e do fascismo, agora atingindo níveis de teoria da conspiração envolvendo a CIA e chancelada pelo Lula —acusando quem discorda ou traz evidências do contrário de “ingênuo” e “manipulado pelo imperialismo”.
O que move esse debate são as frustrações de figuras e a militância personalista, em sua maioria masculina, que não abrem mão do direito de poder dizer como as lutas e as coisas deveriam ser. Atuam dentro dos próprios ideais de luta burocrática e de negociações institucionais, definindo o que é um manifestante bom e como deve ser uma manifestação de verdade.
Parece não haver esforço nenhum desses conspiracionistas para dialogar sobre a escalada de repressão, já iniciada pelo governo petista da época. Se formos pensar bem, um legado de repressão já havia se intensificado em 2013 e estava alinhado às esferas federal, estadual e municipal. Tais investidas repressivas reverberam até hoje. Se junho de 2013 foi faísca para o fascismo, o que significa uma lei antiterrorismo que pode ser usada contra manifestantes e movimentos sociais?
Outra função política dessa narrativa é fugir de um debate sobre como as alianças e políticas públicas de segurança do próprio PT foram colaboracionistas com o fascismo e a extrema direita. Essas políticas e tomadas de decisões punitivistas reforçaram o papel do Estado como principal agente da repressão, não só nas manifestações como no aumento do encarceramento e do genocídio das populações negra, indígena e das favelas.
O ataque a movimentos sociais não vinculados a partidos políticos é muito frequente até hoje. Mesmo assim, quase sete anos após junho de 2013, pessoas continuam se manifestando contra aumentos nos transportes, exigindo poderem circular pela cidade e mostrando que isso é um direito, não uma mercadoria. É lamentável que Lula e tantos outros usem sua visibilidade nacional/mundial para atacar pautas tão legítimas quanto as de 2013, inclusive neste cenário em que a América Latina se levanta na defesa dos direitos humanos e sociais, incluindo o transporte.
Agem como se tudo antes de 2013 estivesse perfeito. Como se o Estado democrático de Direito não fosse uma fantasia e estivesse em pleno funcionamento e a recente e tão fragilizada democracia e os direitos estivessem sendo respeitados nos quilombos, favelas e territórios indígenas. Ao final, o que vemos é a vontade de alterar a realidade e criar uma verdade para justificar os próprios erros, massagear egos e favorecer a narrativa narcisista das lutas.