por Ricardo Araújo Pereira
Eu gosto da minha liberdade de expressão sem ‘mas’
— Senhor, temos um problema.
— O que se passa, Pedro?
— Já vistes o novo especial do Porta dos Fundos, na Netflix?
— A tua pergunta é se eu, Deus todo-poderoso, Senhor do Universo, criador de todas as coisas visíveis e invisíveis, vi um programa da Netflix? Já, sim. Subscrevi o serviço de streaming por causa do “Breaking Bad” e agora tenho visto tudo.
— Estais a ser irônico, Senhor?
— Claro, Pedro.
— Eu preferia quando Vos exprimíeis por meio de parábolas, Senhor. Com a ironia ainda é mais difícil entender o que Vós quereis dizer.
— Neste milênio estou a experimentar a ironia. Habitua-te.
— Bom, é o seguinte: um grupo de comediantes brasileiros fez um filme em que Vós sois gay.
— Oh! Como é possível? Estou tão ofendido!
— A sério, Senhor?
— Não. Presta atenção ao tom. A ironia depende muito do tom.
— Mas, Senhor, eles podem fazer isso? Será que podemos rir de tudo? Quais são os limites do humor?
— Essa questão interessa-me muito.
— Ironia?
— Bravo.
— Muita gente ficou ofendida, Senhor. Dom Henrique Soares, da Arquidiocese de Palmares, cancelou a sua assinatura da Netflix em homenagem a Vós.
— Que homenagem bonita. Sabe quando, na última ceia, eu peguei o pão e disse: “Tomai e comei todos. Fazei isto em memória de mim”? Devia ter acrescentado: “E cancelai serviços de streaming em memória de mim”, também.
— Essa eu percebi. É ironia. Mas Eduardo Bolsonaro também não gostou do filme.
— Quem é?
— É o filho do presidente do Brasil. Foi visitar o pai ao hospital com uma pistola no cinto.
— Ah, sim. Um homem que absorveu bem a minha mensagem de paz e de amor.
— Exato… Estais a ser irônico de novo?
— Claro.
— Estais imparável, Senhor. Ele disse: “Somos a favor da liberdade de expressão, mas vale a pena atacar a fé de 86% da população?”.
— Ah. Uma dessas pessoas que diz “somos a favor da liberdade de expressão, mas”. O “mas” é que interessa, Pedro. Eu gosto da minha liberdade de expressão sem “mas”. É liberdade de expressão sem “mas”, e café sem açúcar. Em ambos, não fica tão docinho, mas não estraga o verdadeiro sabor.
— Então não estais ofendido, Senhor? Não vale a pena lançar uma praga sobre o Brasil?
— Não. Até porque duvido que eles notariam.
*Publicado na Folha de S.Paulo
Pra quem não sabe, o tal ricardo araujo pereira é um humorista português pra lá de ligado ao pessoal do tal porta dos fundos.
É também um crítico feroz de um partido que lá existe e vejam só, o tal partido de direita chamado “Chega” conseguiu eleger um deputado , com pouco mais de 1% dos votos. Foi o que bastou para que o valente ricardo araujo pereira assinasse uma carta aberta contra o tal deputado, pois ele é de direita e torcedor do Benfica.
O problema é justamente esse, segundo o tal ricardo araujo pereira, ele não pode dizer que é torcedor do Benfica, isso seria uma afronta aos outros torcedores que não votaram nele!
É interessante ver este povo que defende o “politicamente correto” justificar este filme.
E aqui ele escreve sobre liberdade de expressão…É hipocrisia que chama né?
Tem que poder sim falar ironias e deboches de Jesus, mais quero saber se debochar de gays e afins pode também ou vão se ofender e processar quem fizer?