6:36Semente

por Thea Tavares

Meio mês já se passou desde que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixou a carceragem da Polícia Federal em Curitiba, onde ficou preso por 580 dias. É possível, com um pouco mais de distanciamento, se ter uma leitura desapegada de ódios e de paixões sobre esse homem e seu papel na história.

Pode-se não gostar, criticar suas ações, seus governos, não votar nele – exercendo a mais legítima forma de se discordar de uma personalidade da política em ambiente democrático -, mas é impossível ignorar sua existência ou até mesmo desconhecer quem seja esse homem chamado de Lula. É memória cultural. Se pararmos para pensar, isso por si só é um feito extraordinário. Um cara, de origem nordestina e pobre de pai e mãe, que vem de uma família de retirantes, cuja primeira vitória da vida foi escapar da mortalidade infantil e da desnutrição, e que na cidade grande virou operário, sindicalista e líder político popular, é possuidor de um registro na história da humanidade.

Não é todo dia, nem mesmo todo século, que uma personalidade com essa origem humilde e com trajetória de representação nas lutas populares e, da Revolução Industrial para cá, pode-se dizer na classe trabalhadora, ganha esse destaque. Os registros oficiais majoritariamente costumam assinalar a passagem de figuras do topo da pirâmide social e não da base. Da base mesmo, só quando se faz imperativo não omitir. E foi o que Lula e o segmento que ele representa conquistaram: o direito de existir enquanto fato histórico!

Antes mesmo de exercer a Presidência da República, o Lula já havia atingido seu patamar de notoriedade. Independentemente dos relatos e registros que ficarão impressos nos moldes e nas plataformas do que prevalecer para contar a história dos nossos tempos, quando todas as gerações contemporâneas a ele não estiverem mais aqui para opinar ou confirmar e independentemente de como o descreverão, sua participação no compêndio das lutas populares no Brasil estará lá destacada: ele existiu!

Não bastasse isso, o próprio partido político criado por Lula há quase quatro décadas, está longe de ser apagado da memória do povo também. Sem nenhum juízo de valor, é fato que mesmo sendo constantemente ameaçado por entraves burocráticos e por ações para cassação do seu registro, o Partido dos Trabalhadores continua aumentando de tamanho. Ainda depois do impeachment de Dilma Rousseff, a legenda ampliou e soma, hoje, mais de 2,3 milhões de filiados. O processo de eleições internas que, na noite de ontem, em São Paulo, ratificou a reeleição da paranaense Gleisi Hoffmann no comando nacional da sigla, envolveu uma organização partidária presente em 4.951 municípios brasileiros. Isso chega a dar um nó na cabeça de muita gente!

Arrisco mesmo a dizer que a existência do PT alcance a totalidade dos 5.570 municípios no país, mesmo que não institucionalmente organizado na forma de diretórios municipais ou comissões provisórias. Tem sempre um petista que participa de reunião de escola, que reclama da falta de recursos e do funcionamento da unidade de saúde, que não perde uma sessão plenária na Câmara de Vereadores. E essa é a única liberdade especulativa a que me proponho a formular na presente análise. Aliás, acredito piamente que nenhuma localidade no país inteiro consiga ostentar o status de não possuir um único simpatizante ao partido de Lula entre seus habitantes.

Mas a intenção não é polemizar e, sim, promover uma reflexão razoável. Muito menos tecer comparativos – seria até covardia – com as desconstruções em curso, sejam as de políticas públicas, de participação popular, das instituições do estado democrático de direito ou sejam as dos recursos naturais. Sem abordar as demais filiações partidárias.  É claro também que não é uma reflexão totalmente isenta, visto que se trata de um artigo de opinião, e até porque podemos olhar para onde quisermos, que só enxergaremos a nós mesmos.

Goste ou não, ame ou odeie, apoie ou condene, vote ou não vote, Lula e o PT merecem figurarem nos registros históricos entre os ícones da resistência popular no Brasil. Nesse caldeirão fumegante das tensões na América Latina, aquela frase, atribuída a um provérbio mexicano, parece que nunca foi tão apropriada para descrever o significado da resistência empreendida pelo lulismo ou pelo petismo nesta era no Brasil: “tentaram nos enterrar, mas não sabiam que éramos semente”.

6 ideias sobre “Semente

  1. Franco

    Lula e sua trupe são e serão considerados pela história tão somente traidores.
    Traíram os ideais que os levaram ao poder. Traíram seus eleitores que, esperançosos de ética e honestidade na política, apostaram no tal partido “dos trabalhadores”.
    Deu em quase nada. Chegaram ao poder e, à moda de PMDB, Arena ou PSDB, trataram de abastecer contas no exterior para os membros e para garantir reeleições infinitas. São piores do que todos os outros, pois enganaram os esperançosos.
    Só por isso chafurdam nas cadeias.
    Por isso perderam para um deputado esquisitão, só porque as pessoas tinham certeza que ele era contra o PT. Por isso não elegem mais ninguém fora do nordeste (por enquanto, logo nem lá).
    O resto é papo furado de petista viúvo forçando a criação de um ícone/presidiário.
    As esquerdas tem que se livrar desse zumbi chamado Lula/PT, daí, talvez sejam levadas a sério um dia.

  2. SERGIO SILVESTRE

    É pra rir ,Franco ,quantas contas acharam do Lula,quantas propriedades tem o Lula,compare com as 17 do Flavio,isso tudo provado,de onde vem o dinheiro,das milicias,ou das rachadinhas.

  3. swissblue

    Um dia li uma cronica da Thea Tavares. Falava do Belchior, domingo … gostei, virei fã. De um tempo para cá me dei conta de sua tendencia esquerdista, Gleici, Lula e hoje este post foi para mim o motivo para desapegar. 3.2.1. no más Madame Tavares.

  4. Thea Tavares

    Sentirei sua falta, Swissblue. Como diria o Vandré, “não canto para enganar”. E o próprio Belchior tascaria: “eu não posso cantar como convém, sem querer ferir ninguém”. Vamos em frente, com liberdade, com nossas verdades, tolerância e com tudo o que faça nosso coração bater mais forte.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.