7:59Livre-Arbítrio

por Fernando Muniz 

“A esposa não quis vir hoje”?

“Achei melhor não”.

O médico folheia os exames. Fixa o olhar em um, durante alguns segundos e retoma a avaliação. Fecha a pasta e suspira.

“Parece que você não tem seguido nada do que eu falo. Tem maneirado na bebida? E o cigarro? Sabe que, desse jeito, você tem mais uns cinco anos de vida, né? No máximo”. Faz que vai abrir a pasta de exames, mas desiste. “Tua esposa te aceitou de volta”?

O paciente está mais interessado na ponta do sapato direito, arranhada, decerto por ter topado numa pedra. Cruza as pernas e passa a examinar o sapato esquerdo. “Tá bom”.

“Como assim”?! O médico não entende. “Tá bom o quê”?

O paciente solta um pigarro e, por reflexo, busca o maço no bolso. Para no meio do caminho, levanta os olhos e se impressiona com as bochechas do médico, rosadas, saudáveis, tratadas com água de colônia e esmero.

“Cinco anos tá bom demais pra mim, doutor”.

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