por Thea Tavares
Tenho uma frustração confessa. Deveria ter sido comediante. A essa altura do campeonato, já estaria rica… Ou banida do convívio social! Sou daquelas que perde um amigo, mas não perde a piada. A debandada é diária, às vezes parece um verdadeiro estouro da boiada. Desperdício lamentável, pois não estamos mais em tempos de desprezar qualquer sopro de alegria ou de camaradagem. O retrato da sociedade atual é sisudo, com cara mais feia que a da fome.
Não fui devidamente orientada vocacionalmente ou diagnosticada como caso perdido a tempo de ser encaminhada com determinação para o humorismo e virei jornalista. Fazer o quê? Vamos combinar que essa distância não anda tão grande assim. Ultimamente, na maioria das vezes, não dá pra competir com a realidade bizarra e não faltam pautas hilárias ou absurdas na narrativa do cotidiano para deixarem o relato dos fatos com cara de piada pronta.
Por outro lado, não havia para mim qualquer garantia de sucesso no ramo do entretenimento. Eu só achava que tinha essa aptidão, mas não era nada atestado. A baliza nesse caso era uma amiga que se divertia às lágrimas com as minhas piadas infames. Descobri depois que ela fumava “um” antes e ficava virada numa hiena. Parecia ter engolido um daqueles antigos sacos de riso. Eu poderia recitar a tabela periódica, que ela se mijaria nas calças. Hoje, não passo do Hidrogênio e o estrago já está feito, mas é porque ela sofre de incontinência! Assim que ler isso, anotaremos outra baixa nas relações sociais. #PartiuFicarQuieta.
Minha filha é quem mais se diverte com meus micos e, por consequência, quem mais zoa por conta disso. Para manter em alta sua diversão favorita, estabeleci a meta de pagar pelo menos um mico por dia. Não só tenho conseguido manter firme essa marca, como quebrar seguidamente recordes de episódios vexatórios e desastrados. Há momentos que são tão constrangedores, que parece que consigo sair do corpo e observar a cena de fora, como uma expectadora sem noção, sem responsabilidade com o incidente e fingindo demência. Por enquanto, logo mais nem será preciso simular, a demência será genuína.
Sabe quando a gente formula uma coisa agradável na cabeça para se dizer, mas quando as palavras saem você ouve espantada sua própria voz falando uma merda sem tamanho, sem precedentes e sem volta? Se não sabe, é porque ou você é felizardo ou um alienígena infiltrado na Terra. O silêncio e o espanto pesam mais que a lei da gravidade nesse instante. Tentar corrigir só piora! O bom – e Pollyanna sempre encontra uma forma de abrandar os infortúnios por instinto mesmo de autoproteção – é ter motivos para rir. A crítica bem humorada e a observação do ridículo no cotidiano sempre andaram ao lado da contestação, da análise, da interpretação e sempre ajudaram a formar e construir opiniões.
Rir, nem que seja da própria desgraça, é uma capacidade de desprendimento ou de despregamento (dispensa maiores explicações). Acontece que não faltam desgraças para a gente gargalhar pelo resto do ano, até não ter mais ar nos pulmões. Dizem que o sorriso ajuda a melhorar e que quem canta seus males espanta, invisto pesadamente nas duas saídas. Carrego o riso como uma bandeira de esperança e faço da cantoria no chuveiro ou durante a faxina o desespero da vizinhança, nessa audiência compulsória. Na melhor das hipóteses, rende muita história pra contar. Afinal, outra característica de não ser gente é a de falar mal do outro. Pra isso, não tem repertório que chegue.