Por Dirceu Pio
É provável que nem o governo federal tenha conseguido enxergar o alcance de sua Medida Provisória, sancionada na sexta-feira, dia 20-09, como primeiro ato de Jair Bolsonaro após sua 4ª. cirurgia, que recebeu o título de Declaração de Direitos de Liberdade Econômica e que estabelece normas de proteção à livre iniciativa e ao livre exercício de atividade econômica e disposições sobre a atuação do Estado como agente normativo e regulador.
O governo avançou até onde pode avançar e garantiu ao empreendedor um grau de liberdade com o qual nunca sequer havia sonhado. Foi um passo enorme rumo à total desburocratização da atividade econômica e uma paulada na espinha do estado fiscalizador, opressor e corruptor.
UMA TSUNAMI DE EMPREGOS
Com a entrada em vigor da MP, o governo prevê geração de 3,7 milhões de empregos e crescimento adicional de 7% no Produto Interno Bruto (PIB), nos próximos anos.
Acompanho o segmento da micro e pequena empresa há muitos anos e tenho um livro publicado de orientação aos pequenos empreendedores (Caminhos Seguros para o Empreendedor, editora Paco) e posso dizer, portanto, que o resultado pode ser até 10 vezes maior se a MP vier acompanhada de um amplo programa de microcrédito e outro, também amplo, de capacitação.
Com o tripé – liberdade para trabalhar, micro-crédito abundante e capacitação – os resultados serão rápidos, pois os pequenos empresários são ágeis tanto na criação de empregos quanto no aprendizado.
SANTA CATARINA
Há exemplo eloquente dessa agilidade: na década de 1980, depois de enfrentar duas enchentes devastadoras, o estado de Santa Catarina começou a enfrentar uma onda enorme de desemprego. Calculava-se na época que o número de desempregados passava de 300 mil, quer dizer, um problema assombroso.
Mobilizados pela associação de micro e pequenos empresários de Blumenau, presidida então pelo economista Pedro Cascaes Filho (coautor do meu livro), os pequenos empreendedores pressionaram o governador (Espiridião Amin) e os deputados para aprovar um estatuto de apoio e incentivo ao segmento.
Na mesma semana da aprovação, o desemprego simplesmente desapareceu como se fosse tirado com a mão.
BICICLETA ERGOMÉTRICA
Na verdade, só patinamos nestes últimos 40 anos no encaminhamento e estímulo ao pequeno empreendedor. E o governo federal nunca soube usar o segmento como parceiro na busca do emprego e na superação de crises na economia.
E as razões são simples: as pastas da economia sempre foram ocupadas por “especialistas” em macro-economia e “ignorantes” em micro-economia. E houve até o caso da economista portuguesa, que ajudara a formular o Plano Cruzado, do José Sarney, Maria da Conceição Tavares, que chegou a admitir a jornalistas do extinto Jornal da Tarde, que não entendia absolutamente nada de pequena empresa.
De Itamar a Lula, passando por FHC, a única ajuda efetiva aos pequenos empresários foi o Plano Real que derrubou a inflação.
O Simples ou o Super Simples não conseguiram vencer a barreira da tecnocracia e nem a mentalidade tributarista -fiscalista incrustada nos governos das três instâncias de poder.
A MP do atual governo deve ser encarada como uma verdadeira alforria da micro e pequena empresa – era quase tudo o que o segmento esperou por décadas a fio.
DA AGÊNCIA BRASIL
Entenda as principais mudanças na MP:
Registro de ponto
– Registro dos horários de entrada e saída do trabalho passa a ser obrigatório somente para empresas com mais de 20 funcionários. Antes, a legislação previa esta obrigação para empresas com mínimo de dez empregados
– Trabalho fora do estabelecimento deverá ser registrado
– Permissão de registro de ponto por exceção, por meio do qual o trabalhador anota apenas os horários que não coincidam com os regulares. Prática deverá ser autorizada por meio de acordo individual ou coletivo.
Alvará e licenças
– Atividades de baixo risco, como a maioria dos pequenos comércios, não exigirão mais alvará de funcionamento
– Poder Executivo definirá atividades de baixo risco na ausência de regras estaduais, distritais ou municipais
– Governo vetou item que dispensava de licenças para atividades de baixo risco que abrangem questões ambientais.
Fim do e-SOCIAL
– O Sistema de Escrituração Digital de Obrigações Fiscais, Previdenciárias e Trabalhistas (e-Social), que unifica o envio de dados de trabalhadores e de empregadores, será substituído por um sistema mais simples, de informações digitais de obrigações previdenciárias e trabalhistas.
Carteira de trabalho eletrônica
– Emissão de novas carteiras de Trabalho pela Secretaria de Trabalho do Ministério da Economia ocorrerá “preferencialmente” em meio eletrônico, com o número do Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) como identificação única do empregado. As carteiras continuarão a ser impressas em papel, apenas em caráter excepcional.
– A partir da admissão do trabalhador, os empregadores terão cinco dias úteis para fazer as anotações na Carteira de Trabalho. Após o registro dos dados, o trabalhador tem até 48 horas para ter acesso às informações inseridas.
Documentos públicos digitais
– Documentos públicos digitalizados terão o mesmo valor jurídico e probatório do documento original.
Abuso regulatório
– A MP cria a figura do abuso regulatório, para impedir que o Poder Público edite regras que afetem a “exploração da atividade econômica” ou prejudiquem a concorrência. Entre as situações que configurem a prática estão:
• Criação de reservas de mercado para favorecer um grupo econômico
• Criação de barreiras à entrada de competidores nacionais ou estrangeiros em um mercado
• Exigência de especificações técnicas desnecessárias para determinada atividade
• Criação de demanda artificial ou forçada de produtos e serviços, inclusive “cartórios, registros ou cadastros”
• Barreiras à livre formação de sociedades empresariais ou de atividades não proibidas por lei federal.
Desconsideração da personalidade jurídica
– Proibição de cobrança de bens de outra empresa do mesmo grupo econômico para saldar dívidas de uma empresa.
– Patrimônio de sócios, associados, instituidores ou administradores de uma empresa será separado do patrimônio da empresa em caso de falência ou execução de dívidas.
– Somente em casos de intenção clara de fraude, sócios poderão ter patrimônio pessoal usado para indenizações.
Negócios jurídicos
– Partes de um negócio poderão definir livremente a interpretação de acordo entre eles, mesmo que diferentes das regras previstas em lei.
Súmulas tributárias
– Comitê do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais da Receita Federal (Carf) e da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) terá poder para editar súmulas para vincular os atos normativos dos dois órgãos.
Fundos de investimento
– MP define regras para o registro, a elaboração de regulamentos e os pedidos de insolvência de fundos de investimentos
Extinção do Fundo Soberano
– Fim do Fundo Soberano, antiga poupança formada com parte do superávit primário de 2008, que está zerado desde maio de 2018.