De Rogério Distéfano, no blog O Insulto Diário

Era desses jantares ciclópicos de manjedouras em Santa Felicidade, em rápida sucessão os frangos à passarinho nadando em alho e a polenta frita de queimar beiço, dois versos de uma ode ao colesterol. Jantar obrigatório, como os de firma e de família, do qual não se foge e que custa os tubos. Dá para tentar escolher a companhia. Só tentar, que o povo chega e senta onde pode, já no meio pileque da boca-livre de batida-de-coco .

Em frente, o chato e a mulher. Ele, como os chatos, bastante em si mesmo; ela, monumento à fêmea desconhecida, devoção de todas as horas de todos os dias. Depois do ‘parente de quem?’ curitibano, a conversa deriva para os bichos de estimação, ele o gato, nós, a cachorrinha Yorkie, um canino felino. A tantas, ele fala do guarda-roupa do casal, onde na parte de cima ficam a espingarda, o chapéu velho e a maleta com fotos dos pais.

Estava de porre, o guarda-roupa  para a conversa sobre bichos? Ele capta, explica, litteris et verbis: “Estava na cama com ‘essa daqui’ [o cara chama o monumento de ‘essa daqui’. É bolsoignaro nato, aprendeu com o ‘isso daí’].”  Pensei, ‘só faltava trancar “essa daqui” no armário’. “O gato estava em cima do armário”, completa o chato. O gato, então, tinha saído do armário? O chato continua.

“Eu transava com ‘essa daqui’ quando o gato saltou do armário, furioso, e arranhou minha perna”. Caiu a ficha. Para o gato o lugar do dono era o armário, não a cama com o monumento. Salvo pelo undécimo giro do garçom, entupi-me de frango, caí de boca na polenta, por pouco não engasguei na lasanha sem gosto nem graça a imaginar delícias com “essa daqui” – ainda que ao preço da perna lanhada pelo gato.