7:08O MP entrou na defesa dos maganos

por Elio Gaspari

O Ministério Público precisa se olhar no espelho. No Supremo Tribunal Federal ele defendeu o fim do foro especial para deputados e senadores. Essa decisão pontual foi festejada como uma conquista genérica. Engano. Menos de um mês depois, no Superior Tribunal de Justiça, o MP sustenta exatamente o contrário, defendendo a manutenção do foro na parte que lhe cabe do latifúndio.

Com o apoio da Procuradoria-Geral da República, deputados e senadores que cometam crimes fora do período de seus mandatos serão julgados na primeira instância. No STJ, contudo, o Ministério Público pediu que se preserve o foro especial para governadores, desembargadores, conselheiros do Tribunal de Contas e procuradores que atuam junto à corte. Em poucas palavras, diante da brecha aberta pelo Supremo, o “Tribunal da Cidadania” defende a jurisprudência do “quem manda aqui sou eu”. Aceita, ela haverá de se propagar pelos estados.

O pedido do MP foi endossado pelo ministro Mauro Campbell e estava sendo julgado pela corte especial do STJ, composta pelos 15 ministros mais antigos. Como o ministro Luis Felipe Salomão pediu vistas, o caso será apreciado em junho. (Salomão remeteu à primeira instância um processo em que é réu o governador da Paraíba.)

Num exemplo hipotético, que poderá ocorrer em alguns estados:

Se um senador e um vereador (ou procurador) forem casados com duas irmãs e ambos matarem as mulheres, o senador será julgado na primeira instância e o vereador (ou o procurador) irá para o Tribunal de Justiça do seu estado. O senador não tem foro especial, mas os outros dois têm.

Expandida, a festa preservará o foro de todos os desembargadores, juízes de tribunais federais regionais, conselheiros de contas estaduais e municipais. E mais, bingo: dos membros do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais.

O foro especial favorece 58 mil maganos com funções em 40 tipos de cargos. A decisão do Supremo Tribunal, restrita a parlamentares, alcança algo como mil pessoas, levando-se em conta que há casos de cidadãos cujo mandato acabou. Na ponta do lápis, o Supremo livrou-se de mais de 60 processos.

A corte especial do STJ deverá decidir a questão no dia 6 de junho. Aberta a brecha, ficará a lição do “poetinha” Vinicius de Moraes:

A felicidade do pobre parece

A grande ilusão do Carnaval

A gente trabalha o ano inteiro

Por um momento de sonho

Pra fazer a fantasia

De rei ou de pirata ou jardineira

Pra tudo se acabar na quarta-feira.

*Publicado na Folha de S.Paulo

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