Quando puxei o canivete com cabo de madrepérola, apertei o botaõzinho e a lâmina de vinte centímetros brilhou, o boyzinho no carrão empalideceu. Eu disse que se ele mexesse um músculo do rosto o aço ia atravessar o pescoço e o sangue sujaria o vestido da dondoquinha ao seu lado. Ficou paralisado. Pouco tempo antes tinha tentado me humilhar, daquele jeito que filhinhos de papai gostam de fazer porque andam com latas importadas ganhas no Natal com fita e laço vermelho. Isso porque parei meu podrão ao lado do dele, sem encostar, sem nada. Quando voltei ao estacionamento da farmácia, onde fui buscar o remédio para hipertensão que é distribuído de graça, ele me olhou da cabeça aos pés e disse que ali não era lugar para estacionar carro velho. Olhei tranquilo e ele deu aquele riso cínico de quem confia na arte marcial que pratica ou então tem uma metranca ao alcance das mãos. A ponta da lâmina parou pertinho do pescoço do tal. Se tenho preconceito contra rico? Depende. Este era o tipo do vagabundo que merecia se borrar nas calças. Pedi para ele repetir tudo o que tinha dito. Apenas balbuciou desculpa. A voz era um fiapo. Encostei a pontinha na veia que pulsava descompassada. Ele pediu pelo amor de deus. Juro ter ouvido uma revolução em seu intestino. Logo veio o cheiro ruim. Não ri. Disse para ele ir embora. Antes dei uma espetada. O sangue esguichou. Entrei no carrão e engoli uma capsula do remédio. Não posso passar nervoso.