Fui buscar o peixe além da linha do horizonte. Isso foi depois de dormir no alpendre do casebre fincado na areia. A rede me protegeu dos pesadelos. Não ouvi Iemanjá, acordei de madrugada, o gole de café forte me colocou na vida. Céu limpo e estrelado. Espuma de ondas desparecendo na areia, força para empurrar a jangada. A vela enfunada é como mão de Deus a guiar. O pescador tem olhos duros e fitam um ponto além de tudo. Ele deixou a rede lá no dia anterior. Por baixo da camisa puída e da pele curtida bate sereno o coração e a esperança de tirar o peixe do mar. A bola de fogo surge no horizonte. Estamos perto. Como ele achou o ponto onde deixou seu equipamento é um mistério que levo para sempre, como os outros, que vivi naquela vila simples no Ceará. Havia peixe. Houve comida com gosto que sinto na boca até hoje. Aconteceu há muitos e muitos anos. Estou em outro continente, mas fiquei lá – e lá ficou aqui.