Amigo meu tinha tomado as de sempre e, numa noite fria e chuvosa, resolveu tirar toda a roupa dentro do bar e foi andar pela rua escura, paralelepípedos brilhantes. Ele sumiu. Talvez tenha ido pra casa. Nunca soubemos, mesmo porque não perguntamos. Pensei nisso ao abrir o chuveiro com água fria muitos anos depois. O gás tinha acabado. No meio da madrugada, vi o filme triste que não tinha nada de namorico e traição cantado pela voz de Evinha. A cabeça doeu na hora. Doeu demais. Olhei pela janela e vi meu amigo em outra situação. Dessa vez tentando apagar um incêndio no quarto que começou num colchão. Passei a bucha natural no rosto, sabonete na cor vermelha para ver se tudo voltava ao normal. Não voltou. Vi o mesmo parceiro esticado numa cama e chorando. Prestei atenção. Ele perguntou seu eu lembrava daquela noite em que saiu pelado do bar para tomar banho de chuva. Eu disse que sim, no pensamento. Ele falou que quase morreu de hipotermia. Fechei o chuveiro. Me enxuguei e me esquentei. Fui para debaixo das cobertas. A tela, ligada. Lá, um filme sobre o Everest. Desliguei.