Puxo o fio das histórias e vem quase tudo. Da solidão forte, amenizada por uma pizza brotinho na pastelaria em frente ao cinema, à alegria do dia em que baixou Didi, Pelé e Garrincha e eu, perna de pau militante, fiz de tudo dentro do campinho de pelada naquela chácara da periferia. Mas por mais que eu puxe, cadê minhas crianças de todos os dias com olhinhos brilhando, beijos estalando na minha testa (a barba muito grande e desgranhada encobria as bochechas e a alma), os abraços de anjos e os sorrisos a iluminar tudo? Não vêm. Como se tudo tivesse sido deletado bem antes de este termo aparecer na revolução tecnológica. Mas eu falo sobre isso e, como acontece com os que se perderam na vida, acho que só aconteceu comigo no universo dos 6 bilhões de seres humanos. Até o dia em que ouvi a mocinha de 24 anos, também três filhos, relatar a mesma dor, só que a quente, por estar acontecendo e ela impossibilitada de fazer algo, porque ainda no atrapalho, ainda tentando se encontrar, mas dando os primeiros passos para tanto. Então falei com ela sobre os meus e revelei que encontrei algo que me leva aos bons momentos – as fotografias que fiz e guardei. Quando se fala em “momento mágico” sobre esta arte, pra mim são aquelas imagens que fazem isso. Eu não consigo puxar o fio, elas me puxam, no retrato do real do que sempre foi e uma camada espessa de não sei o quê levou do departamento de lembranças – mas não apagou. Assim, posso relatar a tal felicidade, principalmente porque há muito tempo estou de fato com eles, os três, agora adultos – e não preciso me esforçar para recordar.
Nossas memórias podem ser botes salva-vidas neste mar que às vezes nos confunde e nos fazer nos “perdermos”. Mas quem se perde, de fato? Há muitos por aí caminhando sem rumo, mas o caminho está lá sendo trilhado. Perder-se faz parte e acredito que só os corajosos têm essa ousadia. E sempre há como voltar, mesmo que a gente não saiba como. Ele, a quem chamamos de Senhor, está sempre presente e quando nos abandona (se é que isso acontece) é porque nossa fé está sendo testada. Não sou crente, nem frequento Igreja. Basta ler a poesia do dia a dia. Jamil Snege, como você sempre o publica neste blog, sabe bem falar sobre Ele. E eu o leio. Ali estão os códigos para decifrar seus enigmas e a saída para um caminhar mais equilibrado.