por Fernando Muniz
O céu está tomado por estrelas, naquela noite em que, com certeza, vai gear. O observador se assusta com as constelações e planetas, tão distantes. Larga o telescópio, do filho, comprado em um arroubo para se aproximar do menino. Sente um tremor, como que um arrepio. Os dentes começam a bater.
Levanta a gola do casaco e volta para dentro de casa, atrás de algo quente. Conhaque, uísque, o que tiver. A visão dos astros, embalada pelo vento abaixo de zero, leva-o para onde não costuma ir. Uma dor de cabeça fora de hora, estranha, começa a incomodá-lo. Evita o espelho, ao procurar uma aspirina.
Busca o controle da TV, atrás de distração. Os canais não trazem nada de bom. Distrair-se, aliás, não faz qualquer sentido. Bisbilhotar o céu com o telescópio o puxou para dentro de si, como se caísse num poço. Os arrepios não vão embora, apesar da lareira acesa e dos goles; continua a bater os dentes.
Vê o filho ir à geladeira. Sente uma pontada na espinha. Como se o guri estivesse a anos-luz.
– Oi, quer jantar com o pai? Você escolhe o restaurante – embora tenha medo da rejeição, fala sem pensar; apenas sente.
O garoto leva um susto. Franze o cenho, incrédulo. Faz tempo que não recebe um convite desses. Qualquer convite. Tanto que hesita em responder. Quem sabe o que deu em seu pai?
– Vamos sim… Está frio lá fora?
Os dentes param de bater.