Editorial da Folha de S.Paulo
Haverá algo de coincidência no fato de a Câmara dos Deputados ter aprovado o encolhimento de reservas ambientais na Amazônia apenas algumas horas antes de gravações do dono de uma multinacional da carne (JBS), Joesley Batista, sacudirem Brasília.
Coincidências podem ser eloquentes. A cadeia produtiva da proteína animal, em particular a bovina, por mais que se modernize, na ponta brasileira se apoia num setor -a pecuária- que abriga muito do que há de mais atrasado no país.
Considere-se a bancada ruralista na Câmara. Seria impróprio dizer que representa a parcela mais avançada no agronegócio nacional.
O principal interesse da enorme bancada de fazendeiros -votos imprescindíveis para as reformas de Temer- é revogar o máximo de restrições ao uso da terra.
Com a chegada de Temer ao Planalto e a escolha de um ruralista para o Ministério da Justiça, Osmar Serraglio (PMDB), teve início a ofensiva contra unidades de conservação na Amazônia, em especial no sudoeste do Pará.
Nessa região se acha a Floresta Nacional do Jamanxim, originalmente com 13 mil km². A medida provisória 756 previa extirpar-lhe 3.000 km²; na Câmara, o talho aumentou para 4.860 km².
O vizinho Parque Nacional do Jamanxim, de acordo com outra MP (758) desfigurada pelos deputados na madrugada de quarta (17), perderá 3.440 km² de seus 8.600 km², se a medida passar no Senado.
Executivo e Legislativo justificam as amputações com base em dois argumentos duvidosos. Primeiro, elas pacificariam a região ao sacramentar pequenas posses de boa-fé. Mas a ocorrência de desmatamento recente no local indica que, em realidade, trata-se de terras de pecuaristas e grileiros.
A outra justificativa seria desimpedir a construção da Ferrogrão, linha de trem paralela à rodovia BR-163. A MP 758 original lhe destinava uma faixa de menos de 10 km² no Parna do Jamanxim, mas também ampliava o parque em 510 km²; os deputados cancelaram a ampliação e ainda aprovaram uma redução total de 1.000 km².
O caos instalado em Brasília por Joesley Batista, paradoxalmente, pode pôr por terra essa investida ruralista. Para que não deixem de vigorar, as medidas provisórias têm de ser votadas pelo Senado em uma semana, até o dia 29 -perspectiva hoje das mais improváveis.
Infelizmente o atraso de muitos pecuaristas está nos fazendo muito mal, a cada nova fotografia da região Norte vemos a floresta amazônica menor, até quando isto? Até esta caterva de deputados e senadores compromissados consigo mesmos, o Brasil para esta gente não representa nada, com tanto que encham os bolsos de dinheiro, preferência muitos bilhões de reais.