7:21PENSANDO BEM…

ROGÉRIO DISTÉFANO

Patrulha do Mijo. Se a expressão ferir o leitor pudico, concedo a atenuação: polícia do xixi. Que nada resolve, pois fica a imagem de alguém a reprimir alguém no ato de liberar a repressão da bexiga. Pois é o que acaba de pôr em ação o trêfego João Dória, prefeito de São Paulo: todo aquele flagrado no ato de urinar em via pública será multado em R$ 500. O ‘aquele’, no caso, inclui as mijonas de rua, também ativas naquela metrópole. Bem-aventurada Curitiba das mulheres cujo recato lacra as bexigas.

João Dória, rico e bem-nascido, cheiroso e formoso, nunca viveu a ânsia agônica dos apuros intestinal e bexigal. Chegou perto, quem sabe, mas ali à mão, sempre teve o peniquinho de ouro e a patente reluzente, em louça de Limoges, terra da porcelana francesa. Ah, sim, também o bidê, indispensável utilitário civilizatório. Agora, civilizador como os tucanos, quer incutir bons hábitos no paulistano, povo que vem de conhecer mercê de sua vitoriosa eleição. Um dia presidente haverá de nos civilizar, os brasileiros.

Lei é lei, manda quem pode, obedece quem está apurado. A lei, na magnífica ironia de Anatole France, tem a virtude de atingir por igual a todos os que mijam, ricos, pobres ou remediados, sejam os homens paulistas, sejam as mulheres – agachadas pelos cantos para desaguaxar. O verbo agachar aqui é alternativo; na minha terra conheço mulheres que aliviam as bexigas em pé, sem molhar as canelas, mesmo com vento forte em sentido contrário. Será que tem disso entre eleitoras de João Dória?

Munícipe que convive com mijões – perdi a conta dos que ofendem o pudor de Mila, minha cachorrinha –, penso na dificuldade dos agentes da lei antimijo: serão homens a patrulhar homens, mulheres a mulheres, o empoderamento (argh!) feminino? E os autos de infração? O mijão, – agora termo genérico, comum-de-dois, finalmente livres da ‘Dilma gramática’ – como exibirá a identidade, a outra, a civil, ao agente da lei? Só tem duas mãos, será uma lá, outra cá? O fiscal ganhará insalubridade?

E a multa, R$ 500? Atingiu-se, em cinco meses da gestão Dória, o salto exponencial da renda per pudenda? Entre entrar no boteco e pagar, sei lá, R$ 20 mil pela privada, o mijão opta pelo custo-benefício dos 500 pilas. As tirivas de Curitiba não me saem da cabeça: onde o fiscal vai fixar o auto de infração? No bingolim, na perseguida, do mijão que não têm limpador de paramijo? Alfinete, elástico de dinheiro? Precisa decreto para regulamentar. Quem sabe a carrocinha para recolher mijões reincidentes, tipo cachorros vadios.

Quem nunca mijou na rua atire a primeira pedra. Ainda estes dias, em longa caminhada, escravo da hiperplasia da próstata, recorri à frondosa árvore do Ahú. Nada contra o erário buscar dinheiro no xixi. Na Holanda o governo tributa o pum das vacas. Os tributos, conceitual, impiedosa e literalmente, perseguem as fontes de riqueza. Mas há modos e meios, a História ensina. Problema é que nossos políticos são ignorantes da História. Tirante o deputado José Carlos Aleluia, baiano, exceção honrosa.  

O imperador Trajano, lá no longevo império romano, cobrava o uso das cloacas, as privadas públicas. O príncipe herdeiro reclamou, “papai, tirar dinheiro do esgoto?” Escapa-me o latim original, mas resgato a resposta antológica de Trajano, vero estadista: “pecunia non olet”, dinheiro não fede. O imperador acabava de inventar a taxa, o tributo pelo serviço público específico, já que o Estado fornecia privadas ao povo apertado. João Dória quer o dinheiro com o cheiro.  Político brasileiro nos tira o dinheiro sem oferecer a privada.  

2 ideias sobre “PENSANDO BEM…

  1. ricardo

    O sempre certeiro Rogério cometeu um pequeno deslize histórico;
    Não foi Trajano e sim Vespasiano o imperador da frase. “Seu herdeiro”
    foi o imperador Tito que posteriormente arrasou Jerusalém.

  2. Carlos Ernandes

    Dr, sempre atento com a forma e o conteúdo, me parece que cometeu um deslize na biografia do Dória: a infância não foi glamurosa, foi de dificuldade. Não era riquinho

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