7:57Uma época de pioneiros idealistas

tvprogramas

 

por Célio Heitor Guimarães 

Cinquenta e cinco anos e meio depois que Luiz Renato Ribas e Rubens Hoffmann criaram a revistinha TV Programas, no quinto mês após a inauguração da televisão do Paraná, a revista virou livro e a televisão virou história – se me permitem parafrasear um recente anúncio da editora Abril.

“A Pequena Notável”, da lavra do mesmo Ribas e do digitador que vos digita, veio à luz na sexta-feira 23, nas dependências do Clube Curitibano, com a presença de amigos, antigos telespectadores e quase uma centena de pioneiros que, com o seu talento, a sua criatividade e muito esforço, concretizaram o sonho de Nagibe Chede, Assis Chateaubriand e Paulo Pimentel – para ficar apenas nos três primeiros canais televisivos de Curitiba –, e que continuam vivos, graças a Deus.

Estiveram lá, entre outros, Ary Fontoura, Sinval Martins, Renato Mazânek, Aracy Pedroso, Lúcio Weber (o notável “Gabiroba”, do Cirquinho Queirolo), os “meninos” dos Calouros do Ritmo (os irmãos, hoje desembargadores, Rui Fernando e Luiz Cezar de Oliveira, Ruben Rolin e Anadir Salles), Moacyr Gouvea, Paulo Pimentel, toda a família de Osni Bermudes, Chacon Júnior (na verdade, o autêntico Roberto Carlos), Ali Chain (o Califa 33), Carlos Fernando Mazza, o neto de Aluízio Finzetto, Beto Bruel, José Kalbrenner Filho, Paulo Marins, Ney Freitas, Walter Schmidt, Alia Haddad, José Domingos, Jota Pedro e Wasyl Stuparik.

A data não era das melhores, antevéspera de Natal, mas era a única disponível na agenda do nosso Ary Fontoura. Como deixar de atender o inesquecível “Dr. Pomposo Ribeiro” que, nos idos de 1962, conquistou o inédito e nunca mais alcançado índice de 92,29% de audiência no vídeo paranaense?

No Início de Conversa, que precede a narrativa de “A Pequena Notável”, advertimos que a história ali contada não é toda a história de televisão do Paraná. E nem poderia sê-lo, já que essa história ainda está sendo construída. O que se procurou narrar foi o nascimento do novo e importante meio de comunicação, diversão e cultura em nosso Estado, como ele foi idealizado, alicerçado, lançado e desenvolvido nos anos iniciais (as décadas de 60 e 70 do século passado). E depois consolidado. A luta de pioneiros idealistas – a maioria vinda do rádio ou do teatro –, que, sem nenhuma experiência e muito pouca estrutura, levaram avante o sonho inicial de Nagibe Chede.

Isso tudo foi registrado em tempo real por TV Programas, publicação igualmente pioneira, que cresceu ao lado da televisão da Terra dos Pinheirais e, por mais de quinze anos, foi companheira inseparável do telespectador paranaense, junto ao qual manteve uma credibilidade ímpar e que um dia chegou a ser considerada pelo publicitário paulista Wilson Arnaldi Thomaz, “a melhor revista do gênero no Brasil”.

A revista precisava virar livro, ao menos como registro histórico de uma época que deixou saudade. O objetivo, porém, é que, além de aplacar a nostalgia dos saudosistas, sirva como fonte de pesquisa para os interessados mais jovens e, um dia – quem sabe? – aos futuros arqueólogos da arte televisiva paranaense.

Para tanto, tem a chancela qualificada do jornalista José Carlos Fernandes, professor da UFPR e o melhor texto da imprensa paranaense, cujo prefácio valorizou sobremaneira a publicação:

“ ‘A Pequena Notável’ nasceu dotada de um estranho poder: atiça os sentidos. Todos eles. Ao mesmo tempo, sem recorrer a artifícios farmacológicos. É como se ganhássemos ingresso livre para qualquer tipo de brinquedo de um parque de diversões, numa tarde a perder de vista. Mesmo os que só sabem dos anos 1960 e 1970 “de ouvir falar” se veem assaltados, a cada página, por aquele mundo que rescendia a Vick VapoRub e a veneno de bomba de flit. É mais do que bom. É sonho que não acaba nunca.

(…)

“Essas e outras vastas sensações são possíveis graças à intimidade, uma especiaria rara que não se encontra à venda, mas estocada nos guardados dos jornalistas veteranos Luiz Renato Ribas e Célio Heitor Guimarães. Eles estavam lá, vivinhos da silva, diante de um televisor Colorado RQ com papel celofane na frente, logo que primeira válvula começou a esquentar.

(…)

“Ribas & Célio não eram só os homens que estavam lá como se encontravam muito perto, em riba da história, pilotando a edição de TV Programas, revista de bolso que marcou época no Paraná e que, espalhem, não encontrou concorrentes à altura em nenhuma outra praça.

(…)

TV Programas, em miúdos, captou a insustentável leveza da Jovem Guarda, mas também as pequenas reviravoltas juvenis, as angústias de um mundo que dava um abraço no futuro ao simples apertar do botão do novo eletrodoméstico. Feche os olhos e imagine: o homem chegava à Lua (papais-sabe-tudo diziam que era montagem), as saias subiam a níveis diabólicos, os cabelos cresciam ao vento. Simone de Beauvoir comandava a grita e, mesmo assim, a mais severa das donas de casa reivindicava… um fogão Wallig. Em segredo, e de bobs, quem sabe, esperava tropeçar em Jardel Filho na frente do Guaíra. Na falta dele, valia um flerte com Sinval Martins na esquina da Barão do Rio Branco. A inocência, como tudo mais, ia para o inferno, mas nada que roubasse a paixão popular pelo palhaço Chic-Chic ou pelo Capitão Furacão. Só uma revista de bolso para dar conta do recado. Um favor: tratem-na no diminutivo (‘revistinha’) só se for por carinho.”

Modéstia à parte.

Uma ideia sobre “Uma época de pioneiros idealistas

  1. Nosferatu

    A televisão brasileira está tão ruim que foi isto o que nos restou, olhar para o passado e ver como regredimos. A internet para uns é a redenção da humanidade, para outros é a universalização da vulgaridade, da mediocridade e da ignorância sem peias. Como era bom o tempo em que via sábado à tarde o Cirquinho Canal 6, hoje temos que suportar “comediantes” do calibre do filho do Chico Anísio que, do pai não herdou nada. Jamais imaginei que um dia iria ter saudades do tempo da televisão B/P, dos televizinhos e das propagandas ao vivo. Acho que morri mas esqueci de me deitar.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.