Atropelado fui pela modernidade de agora, que já faz um tempo. Meu pai nunca teve conta em banco e, também, nunca comprou a prazo. Operário, juntava o dinheiro que economizava e pagava à vista o que precisava para a casa. Faz tempo que ele e minha mãe morreram. O guarda-roupa do quarto deles ainda está inteiro, em pé, num quarto vazio lá em casa. Certo que os cupins tomaram conta, mas isso é outra história. Meu pai vestia terno, paletó jaquetão de seis botões, chapéu e sapato de cromo alemão quando ainda morava numa pensão perto do boteco em que trabalhava. Depois, nunca teve um carro, telefone, etc, mesmo chegando a ser um comerciante razoável. O dinheiro ele guardava numa caixinha de madeira que mandou fazer e cuja chave era guardada no mistério. Por que lembro disso? Ah, sim, acabei de abrir na internet o extrato da minha conta e confirmo que estou falido e sem perspectivas, como o país. Já ralei o suficiente na vida e não tenho nada, além dos tesouros que são os filhos. Moderno pra mim foi o fax, mas tive de me adaptar. Hoje penso que esqueci o pinto com as bolas quando saio sem o aparelho de telefone celular. Ninguém me telefona, mas isso também é outra história. O que resta dos meus cabelos estão brancos e, se perdi muitos fios no alto da cabeça, ganhei uma barriga que chamam de pança e eu tento não vê-la porque sinto dor na alma. Sou um velho que gostaria de ter um radinho Spika com aquela capa de couro, mais nada. Dizem que os jogos na internet viciam. Teve um tempo que me viciei em bocha e depois em snooker. Mas foi aí que entrei numa sinuca de bico – e nunca mais saí. Sobrevivo de lembranças e minha mente já falha muito. Talvez me coloquem num asilo e eu sugeri um spa de rico. Todos na família são pobres. Contas negativas e a mania de esperar que vai acontecer algum milagre, que eu chamo de Megasena, uma boa tapeação para manter os escravos sem pensar em revolta. Suicídio não está no meu cardápio. Gosto de viver as emoções da vida. Não as do Roberto, que era bom nas curvas da estrada de Santos e depois virou um bundão manco. Por que escrevo? Simples: chamo meu computador de Remington. Nem tudo está perdido.