por Yuri Vasconcelos Silva
Um ponto, o toque do grafite no papel. É o zero em arquitetura, em desenho, na arte. Às vezes morre nisso mesmo, porque a ideia teima em não descer, não passar das pontas do dedo para o lápis. Quando há sorte, o ponto se estende em um traço. Gosto do traço reto. É objetivo, racional, um mínimo múltiplo que representa muitas formas sintetizadas em um gesto. O horizontal é a terra, o mundano, o humano. É o sentido natural do olhar. É cinemático. Representa aquilo que é seguro e estável. A linha vertical faz olhar para o alto. Não se conecta ao homem, está fora de nossa percepção ordinária. É extraordinário e transcende. Vai aos céus, esse local da busca constante do homem. Com os pés no chão, olhamos para as torres e catedrais, erguendo a cabeça para o alto e, conforme o estado da alma e da arte, ajoelhando-se. Estes objetos nos escapam e também nos esmagam com sua grandiosidade. A linha vertical é aquela que conecta a terra com o transcendental. As curvas são variações desnecessárias, habilidade que pertence à esfera natural. Jamais saberei traçar uma curva tão bem quanto o vento faz com as montanhas, a água faz com as pedras ou a terra faz com os troncos de árvores. Não tenho o tempo e a paciência de traçar a linha torta que leva mil anos para ficar perfeita e ainda não está terminada. O barroco das curvas é instrumento exclusivo da natureza – e exclui a criação do homem. A curva é divina. Para nós, sobram as retas. Elas se cruzam e criam ângulos. Elas se fecham em espaços bidimensionais. Planos, linhas que são arrastadas, partem espaços. Reservam algo para alguma função, mesmo que seja apenas a fruição. Como um bolo que é fatiado através do fio laminar em apenas dois golpes, duas linhas. Quando é concedido ao plano a liberdade de subir em outro eixo, para o alto, então ele ganha a existência tridimensional, o nosso universo. Desenhos ganham o espaço, tornam-se construções sólidas. Esculturas funcionais nas quais podemos entrar. Ou apenas sentar e apreciar. Saborear o objeto apenas com os olhos. Perceber o tempo passar através do lento avanço das sombras, da sutil mudança de cores. Por vezes, até mesmo alguma música vem à cabeça, uma trilha sonora pessoal para deleite do espaço. Não se trata apenas de pura construção organizada de blocos, cimento e ferro. É intencional e planejado para provocar respostas emocionais em todos que entram em contato com o objeto. Se nada provocar, nem mesmo algum estranhamento, então não é arquitetura. É apenas mais um lançamento no mercado imobiliário.
*Yuri Vasconcelos Silva é arquiteto