11:51Silêncio para os homens de bem

por Yuri Vasconcelos Silva

Como compreender um universo frio e indiferente pipocar todo tipo de vida na periferia de uma galáxia vagabunda, num aglomerado de outras galáxias com trilhões de estrelas multiplicando ainda mais planetas, todos em silêncio retumbante? Nem mesmo um sinal, uma piscada que nos retire o peso de estar sozinhos, enquanto se olha pro céu coçando a cabeça, com a dúvida eterna sobre a razão disso tudo. Existir para então preparar-se a não mais existir. Talvez parte do sofrimento se assente na consciência da própria morte. Os louva-a-deus ou cães sabem de sua finitude? A inteligência pode ser uma maldição, como a imortalidade é para um vampiro. Se não soubéssemos de nossa solidão profunda, de nossa carência existencial e do fim de tudo aquilo que amamos, incluindo nosso próprio corpo, atingiríamos o nirvana aqui mesmo – e ainda economizaríamos um bocado em psiquiatras, remédios e academia. Mas Deus não quis assim, aparentemente. Aliás, Seu silêncio é mais profundo que das outras vidas que poderiam estar lá fora, em um planeta perdido. Se não for mais um delírio coletivo, como hoje acontece com as Redes Sociais e seus discípulos de cabeças recurvadas, Deus deveria ter sido encontrado no grande acelerador de partículas ou em algum buraco negro distante. Nada até agora. Todos os campos da ciência vasculharam cada recôndito da natureza e o máximo que foi encontrado foi uma tal partícula de deus, mas que nada tem a ver com o Criador. Foi apenas marketing, um termo de impacto para atrair a atenção da mídia. Enquanto isso, agonizamos com este poder de pensar e questionar. Sabemos da morte, das traições, das tragédias humanas. Do que somos capazes, do horror. Inventamos e repetimos o holocausto, devastamos outras espécies, investimos trilhões em armas e tecnologia para destruirmos a nós mesmos, mas em outro país. Somos os seres mais vaidosos entre todas as demais espécies deste planeta. Uma imensa indústria nos manipula para tirar nosso dinheiro baseado no vício da vaidade. Estas mesmas indústrias amam o dinheiro e, por isso, são também nossas escravas. Um ciclo infernal de dependência mútua.

Em uma vida completa, seremos educados, aprenderemos a amarrar o tênis, vamos nos apaixonar, alguém vai partir nosso coração e, algum outro, nossa cara. Vamos descobrir o sexo – alguns vislumbram Deus aqui -, conhecer o futuro companheiro, casar, ter filhos e divorciar. Repetir algumas vezes a parte do casar e divorciar. Construir algo que pareça dar algum significado ao fato de existir. Pode ser uma família, uma carreira, uma bonita casa ou uma coleção de selos. Quando tudo estiver começando a ficar interessante, morreremos. Mesmo que se evite pensar na própria morte, ainda que esteja escancarada em todos os canais da TV ou do Netflix, sabemos que ela é certa como a noite depois do dia. Apenas não se conhece a hora que este sol se põe. A morte representa a derradeira oportunidade para algum contato com Deus, e entender para quê demos uma passada tão ligeira na Terra. Se não houver qualquer resposta, provavelmente é porque a consciência cessou por completo e simplesmente deixamos de existir. O que, considerando-se o horror dos tempos por aqui, é um bom paraíso.

*Yuri Vasconcelos Silva é arquiteto

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