por Zé da Silva
Tinha uma foto dentro do livro de fotos. Um pequeno rasgo que entrava na imagem estava colado com durex. O livro era de imagens sobre cinema – das filmagens aos bastidores. Agência Magnum. Quando ele tirou a fotografia que tinha feito há muito tempo, Chaplin, que estava escondido, apareceu com uma flor nas mãos em Luzes da Ribalta. Ele olhou essa e a que tinha agora na mão esquerda. Uma criança sentada em cima de uma mesa e olhando para cima, onde um lustre feito de palha iluminava tudo como se estivesse recebendo a carga direto do céu. O menino, de cabelos cacheados, estava encantado, queixo pra cima, olhar direto naquela imensidão luminosa. Ele lembrou aquele momento mágico, o lugar em que foi feito o registro, e ficou feliz por constatar que nem tudo tinha sido como ficou registrado em sua mente atrapalhada pela alma turva. Nunca vinha coisa bela como aquela, apenas algo cinza, negro, que não tinha a ver com os filhos. Aquele menino da foto dentro do livro de fotos, entretanto, era a prova, trinta e cinco anos depois, de que o pai foi feliz sem saber.