por Zé da Silva
Câncer
Era um canalha. De nascimento. Mal caráter juramentado. Mas ele não sabia. Como o chato de galochas que não sabe que é chato, apesar de andar com uma plaquinha na testa identificando-o. Invejoso, ladrão, seus valores eram o poder de corrompimento, ou seja, a grana. Emprestava a mulher para os chefes no trabalho a fim de ganhar promoção. Tinha filhos, não sabia se eram dele mesmo (e falava isso com boca cheia). Por isso, não dava a mínima atenção a eles. Namorava putas, a quem presenteava mais do que a mulher, que o amava e fazia todos os seus gostos. Apanhava na cara de vez em quando, mas quando via quem o agredira, tempos depois, normalmente vítima de uma safadeza sua, ria como um corno manso. Se pudesse, dizia até que o outro tinha razão. Um pulha, enfim. Um dia, encontrou um maluco que colocou a lâmina de uma navalha em sua carótida e perguntou porque tinha feito a filhadaputice. A resposta o salvou da morte: “Não tenho vergonha na cara, porque tenho rosto”.