19:59O Discurso da Onda

por Hunter S. Thompson

Lembranças estranhas nessa noite nervosa em Las Vegas. Cinco anos depois? Seis? Parece uma vida inteira, ou no mínimo uma Grande Era – o tipo de auge que nunca mais volta. San Francisco na metade dos anos 60 era um lugar muito especial para estar, em um tempo muito especial para viver. Talvez tenha significado algo. Talvez não, no fim das contas… mas nenhuma explicação, nenhuma combinação de palavras, músicas ou lembranças é comparável à sensação de saber que você esteve lá, que viveu naquela parte do mundo durante aquele momento. Seja lá o que tenha significado isso…

História é um assunto nebuloso, por todas as merdas que acabam incluídas mais tarde. Mas, mesmo sem podermos ter certeza nenhuma sobre a “história”, parece bastante sensato imaginar que, vez ou outra, a energia de uma geração inteira atinge seu ápice num instante magnífico e duradouro, por motivos que na época ninguém compreende por inteiro – e que, em retrospecto nunca explicam o que realmente aconteceu.

Minha principal lembrança daquela época parece se estender por uma, cinco ou talvez quarenta noites – ou inícios de manhã – quando eu saía do Fillmore meio alucinado, e em vez de ir para casa, corria a quase 160 por hora pela Bay Bridge com minha enorme 650 Lightning, usando bermudas L.L. Bean e um casaco de lã da Butte… voava pelo túnel da Treasure Island sob as luzes de Oakland, Berkeley e Richmond, sem saber direito qual saída pegar quando chegava na outra ponta (sempre empacava no pedágio, alucinado demais para me controlar enquanto procurava dinheiro trocado)… mas sempre absolutamente seguro de que, não importava a direção que tomasse, acabaria chegando a algum lugar que conheceria pessoas tão chapadas e enlouquecidas quanto eu. Disso não se podia duvidar…

Havia loucura rolando por todos os lados, a qualquer hora. Se não estivesse rolando do outro lado da baía, estava rolando depois da Golden Gate ou descendo a 101 até Los Altos ou La Honda… Era possível ficar louco em qualquer lugar. Todos compartilhavam de uma sensação fantástica de que estávamos fazendo algo correto, mesmo sem saber o que era… sentíamos que estávamos vencendo…

E acho que essa foi a armadilha – essa sensação de vitória inevitável sobre as forças do Antigo e do Maligno. Não num sentido cruel ou militar;não precisávamos disso. Nossa energia simplesmenteprevaleceria. Lutar não fazia sentido – tanto do nosso lado como no deles. Aquela era nossa hora; estávamos na crista de uma onda imensa e linda…E agora, menos de cinco anos mais tarde, basta subir um morro íngreme em Las Vegas e olhar para o Oeste com a predisposição adequada para quase enxergar a marca da maré – o lugar onde aquela onda enfim quebrou e se retraiu.

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