Do blog Cabeça de Pedra
Um dia parou o carro naquela rua do bairro nobre para matar uma curiosidade de anos. Entrou na porta aberta da minúscula e velha mercearia. Pediu um quilo de café. A atendente era uma senhora de quase 80 anos, cabelos brancos desgrenhados, vestido colorido, poucos dentes na boca. Mesmo assim ela sorriu e ele fez o pedido. Ela disse que ia verificar se tinha ou não. Ele olhou as prateleiras quase vazias, o balcão do tempo em que Ney Braga era capitão do Exército, as várias garrafas de cachaça barata se destacando na paisagem. Ela disse que trabalhava ali há meio século, desde o tempo em que só existia mato só em volta – e o povo era pobre e comprava para pagar no final do mês o que foi anotado na caderneta. O marido morreu, ela ficou com o comércio e a casinha dos fundos, separada daquele espaço apenas por uma porta atrás de uma cortina surrada. Ele pagou o último pacote de café que ali existia e perguntou se ela abria a venda todos os dias. Ela respondeu que sim, porque era a única diversão da sua vida . Disse também que ficava sempre feliz quando os aposentados entravam ali para beber e jogar conversa fora. Revelou, porém, que um por um foram morrendo. Ele ficou triste por ela, mas feliz por finalmente conhecer um pouco da história daquele pedaço da cidade.