Da Folha.com
Cineasta português Manoel de Oliveira morre aos 106 anos
Morreu nesta quinta-feira (2), aos 106 anos, o cineasta português Manoel de Oliveira. A informação foi confirmada pelo produtor de seus últimos trabalhos, Luis Urbano.
Considerado o diretor mais longevo do mundo, durante sua carreira ele produziu cerca de 60 filmes, sendo o primeiro deles ainda na época do cinema mudo. Seus últimos trabalhos foram os curtas “O Velho do Restelo” e “Chafariz das Virtudes”, de 2014, inspirados em textos de Camões, Teixeira de Pascoaes e Cervantes.
Antes disso, o filme “O Gebo e a Sombra” —uma comédia dramática, adaptação da peça de 1923 do português Raul Brandão, com os atores Michael Londsdale, Claudia Cardinale e Jeanne Moreau— foi apresentado no verão de 2012 no Festival de Veneza. Naquele mesmo ano, ele rodou o curta “O Conquistador Conquistado”, sobre Guimarães, cidade do norte de Portugal nomeada capital europeia da Cultura.
Em sua longa carreira, trabalhou com atores como John Malkovich, Catherine Deneuve e Alfredo Mastroianni.nteriorPróxima
TRAJETÓRIA
Manoel Cândido Pinto de Oliveira nasceu em 11 de dezembro de 1908, no Porto, filho de uma família da alta burguesia industrial. Considerado um mau aluno, dedicou-se ao atletismo, mas só se interessou pelas artes aos 20 anos, quando entra na escola de atores fundada em Portugal pelo cineasta italiano Rino Lupo.
Neste período, Oliveira criou seu primeiro filme, o curta-metragem “Douro, Faina Fluvial”, de 1931. A estreia em um longa de ficção só veio em 1942, com “Aniki Bobó”, sobre a infância pobre na região do rio Douro.
Desiludido com o fracasso da primeira ficção, Oliveira abandonou outros projetos e dedicou-se aos negócios da família: vinho e indústria têxtil. Voltaria aos longas apenas duas décadas depois, com “Acto de Primavera” (1963), recriação da Paixão de Cristo.
Conhecido por seu estilo rigoroso e reflexivo, pelas cenas longas, com câmeras fixas, ausência de música e de cenas de sexo e violência, ao longo dos anos, Oliveira encantou críticos de vários países, mas espantou, muitas vezes, o público português.
Até os 70 anos de idade, o cineasta português Manoel de Oliveira era apenas uma nota de rodapé nos livros de cinema. Representante de um país sem tradição cinematográfica, era autor de apenas quatro longas-metragens, alguns curtas e vários projetos não realizados.
A consagração internacional veio “Amor de Perdição”, em 1978. A partir daí, financiado pelo governo português, passou a filmar com maior constância. Durante a década de 90, lançou um filme por ano, atraindo prêmios e homenagens de festivais de cinema, como Cannes, Veneza e Berlim.
Para qualquer outro artista, a idade avançada representaria o fim. Para Manoel, tratava-se apenas de um recomeço (mais um, numa carreira repleta deles). Dirigiu longas como “Os Canibais” (1988), “A Divina Comédia” (1991), “Vale Abraão” (1993) e “Um Filme Falado” (2003). Trabalhou com grandes atores do cinema como John Malkovich, Catherine Deneuve e Michel Piccoli, um de seus grandes parceiros.
Indicado sete vezes para o Festival de Cannes, Manoel de Oliveira recebeu uma Palma de Ouro especial pelo conjunto da obra, há três anos. Foi comparado pelo diretor-geral do festival, Thierry Frémaux, a Fernando Pessoa, “outro gênio de Portugal.”
Mas o diretor não quis saber de descanso. Voltou a Cannes, dois anos depois, para apresentar “O Estranho Caso de Angélica” na mostra oficial “Um Certo Olhar”. O longa, uma coprodução brasileira sobre um fotógrafo contratado para tirar o retrato de uma moça morta, também foi escolhido para abrir a 34ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, no mesmo ano.
O cineasta, inclusive, viria para a cerimônia de abertura, mas ele se recuperava de uma cirurgia para colocar um marca-passo e só pôde enviar um vídeo para compensar a ausência.
Manoel de Oliveira deixa a mulher, Maria Isabel Brandão de Meneses de Almeida Carvalhais, quatro filhos e cinco netos, um deles o ator Ricardo Trêpa.