10:37Começou

por André Singer

Algumas semanas afastado foram suficientes para perceber que fevereiro representou um salto na conjuntura. Até o fim de janeiro, a entrada em zona de turbulência era previsão. Agora, tornou-se realidade. Pior, algumas barbeiragens dos pilotos (governo e oposição) colocam a aeronave em condição mais frágil do que o necessário para o que vem pela frente.

Primeiro o previsível. Com perdão do cabotinismo, em 07/06/2014 escrevi aqui que o pleito de 2014 seria parecido ao de 1998. Um governo em dificuldade, mas com lastro positivo atrás de si, iria prometer mudanças, isto é, melhora na situação econômica das camadas populares, sabendo que não poderia cumprir a promessa. A maioria do eleitorado daria um voto de confiança, para decepcionar-se em seguida. “O risco maior é se repetir em 2015 a debacle de 1999”, dizia a coluna de então.

Dito e feito. Tal como em 1999, quando sobrevieram as consequências recessivas do ajuste cambial de Fernando Henrique Cardoso, o Datafolha publicado no dia 8 passado mostrou que explodiu a rejeição ao governo. O índice de ruim e péssimo da presidente subiu 20 pontos percentuais desde dezembro, levando-o a 44%. FHC ficou com 46% no seu pior momento.

Segundo elemento esperado, o escândalo da Petrobras segue a gotejar notícias negativas para o PT e para um dos núcleos principais da economia nacional. Foi vazada mais um trecho de delação premiada, em que o partido é acusado de ter recebido 200 milhões de dólares. A procuradoria endurece e exige 4,5 bilhões de reais de indenização a empresas envolvidas. Uma das maiores agências de risco mundiais rebaixa a nota de crédito da estatal.

Dada a exiguidade de espaço, não vou analisar fatos incidentais à trama principal, embora relevantes, como o bloqueio das estradas por caminhoneiros em 14 Estados e a impressionante mobilização dos professores no Paraná. Protestos de todos os lados também eram favas contadas.

Reservo estas últimas linhas para mencionar o que considero os erros de pilotagem. O governo se equivocou na eleição para a presidência da Câmara. Se era para perder de maneira estrepitosa (267 a 136), melhor seria ter-se composto com Eduardo Cunha, por mais amargo que fosse o remédio. Agora, tem não apenas uma pedra no sapato, como corre o risco de ficar isolado a uma base que representa apenas um quarto da Casa.

A oposição erra ao deixar o impeachment no ar. Por mais fragilizado que comece o mandato atual, ele é comandado por uma mulher cujas credenciais democráticas e probidade pessoal são notórias. Ameaçar retirá-la do cargo por um artifício jurídico equivale a tentativa de golpe branco. Dividirá o país. É o tipo de situação que se sabe como começa e não se sabe como termina.

*Publicado na Folha de S.Paulo

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