7:51A força do Djonga

Certa vez o jornalista Carlos Maranhão escreveu uma reportagem para a revista Placar sobre o lateral Zé Maria, do Corinthians. Antena ligada, deixou registrado para sempre a marca daquele jogador ao defini-lo com uma parte da letra da música que ouviu ao chegar ao Parque São Jorge: força estranha no ar. Dionísio Filho, uma das raras amizades que fiz durante o longo tempo de convivência no mundo do futebol, tinha uma força descomunal e conhecida. Não era a física, apesar de ele a ter, mas da energia contagiante e alegre que transmitia. Ele, que sempre definia a quem gostava como “sangue bom”, era mais que isso. Antes de encontrá-lo no leito do hospital anteontem, algo que jamais imaginaria ver, cruzávamos o caminho na pista do Parque Barigui, onde a parada necessária, de poucos segundos, valia como um aditivo para a vida. Djonga, que começou a carreira ao lado do Doutor Sócrates, outro que foi antes do tempo, no Botafogo de Ribeirão Preto, era meu mestre das gírias, das expressões que dizem muito mais que compêndios acadêmicos e ainda nos fazem rir. Sua alma era de anjo e sua maneira de encarar a vida, positiva – talvez daí a amizade com Jorge Benjor, que um dia lhe deu um boné e o signatário, também fã do grande artista, lhe encheu tanto a paciência, durante anos, que ele acabou cedendo e repassando o presente, hoje um tesouro muito bem guardado no baú sentimental. Djonga conseguia ter a pegada do violão de Benjor. E cantava muito bem todas as músicas do repertório. Salve, simpatia! Foi por isso que exigi que levasse o instrumento e soltasse a voz durante uma entrevista que fiz com ele para o programa “Musga da Cachola”, da Rádio Evangelizar. Ali, ele revelou algo que jamais desconfiei. Anos atrás, quando fiz um perfil de sua carreira e vida para a revista Placar, ele jogando pelo Pinheiros, estava naquele período em que até os que têm aquela força vacilam. Contou que pensava em encerrar a carreira, ele que se destacou mesmo no Atlético Mineiro, onde conheceu sua amada Suely, que viria a ser mãe dos três filhos (o advogado Cristiano, a jornalista Bibiana e o futuro boleiro Marcio Eduardo). A reportagem, revelou, tirou aquilo da sua cabeça, da sua alma. Quem não se comoveria com isso? Dionísio era um anjo negro, mas ai de quem pisasse em seu calo, principalmente em relação à sua cor. Quando sentia qualquer resquício de preconceito, explodia como uma tempestade – e não foram poucos os casos em que atropelava o inimigo com a força dos músculos. Claro que aos amigos permitia tudo – e estes pegavam no seu pé nas brincadeiras. Um dos apelidos pouco conhecidos que tinha, por exemplo, era “De Bronze”, revelado por Marinho, com quem jogou no Pinheiros e que também partiu recentemente. Vi duas vezes o grande Dionísio Filho chorar. A primeira, anos atrás, no vestiário, depois de ele ter quebrado a perna do garoto Vitor Gavilan, que estreava no profissional do Coritiba, durante uma partida disputada no estádio Erton Queiróz, pelo Campeonato Paranaense. A segunda, anteontem, quando fui visitá-lo no hospital, pouco antes da despedida, ele com os olhos amarelos, lutando pela sobrevivência no jogo da vida que nos apresenta situações inesperadas e, muitas vezes, sem solução. Djonga perdeu, perdemos todos nós que o conhecemos como jogador, como cronista, comentarista esportivo e, princialmente, como grande ser humano que nos passou, do seu jeito, o máximo da força positiva que precisamos para aguentar trancos como este.

2 ideias sobre “A força do Djonga

  1. Jose maria correia

    Li com muita tristezao texto escrito com a alma,perdemos todos com a partida do Dionisio, aquele sorriso iluminado nunca mais, muita tristeza ficarå entre nós. Jm

  2. Célio Heitor Guimarães

    Grande Zé: Não conheci Dionísio pessoalmente, só pela TV e pelo jornal, como comentarista. Mas gostava dele. Por isso, solidarizo-me com o sua tristeza, que é de todos nós. Mais um “sangue bom” que vai antes da hora. Um sentido abraço à família dele.

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